13º OLHAR DE CINEMA – DIA 05

13º OLHAR DE CINEMA – DIA 05

Este, talvez, tenha sido o dia em que a sequência de filmes ficou abaixo do que os outros dias acabou me proporcionando. Foram dois filmes brasileiros que estavam na Competitiva Brasileira (O Sol das Mariposas e O Rancho da Goiabada, ou Pois é Meu Camarada Fácil, Fácil Não é a Vida) e um filme da Competitiva Internacional (As Noites Ainda Cheiram a Pólvora).

Se em algum dos outros textos já publicados aqui no site eu indiquei a linha do protagonismo feminino nos filmes escolhidos pela curadoria do festival, agora passo a perceber, também, um olhar de resgate das histórias. Foi assim com Quem é Essa Mulher? e, também, com o maravilhoso Eu Não Sou Tudo Aquilo Que Quero Ser. Neste dia o filme que traz essa perspectiva é o moçambicano As Noites Ainda Cheiram a Pólvora.

 

O SOL DAS MARIPOSAS (2024)

O filme nos leva ao norte do Paraná, no ano de 1975, em uma fazenda produtora de café que está sendo tocada por Martha (Anidria Stadler), uma mulher casada que não sabe o paradeiro de seu marido e tem que manter a fazenda de pé, por esta ser a sua única fonte de renda.

Evidentemente estamos diante de um filme de baixíssimo orçamento, mas que tal realidade não pode ser usada como desculpa para a pobreza do roteiro bem como para as incongruências criadas pelo próprio diretor Fábio Allon. Há uma tentativa, aqui, de remontar uma fazenda de café no ano de 1975, ano em que ocorreu uma grande geada que ficou conhecida como “Geada Negra”, mas que em momento nenhum, tal ambientação conseguiu ser, de fato, algo enxergado como da década de 70. O diretor não se utiliza de itens da época, o que ele faz é criar cenários desprovidos de quaisquer características, sendo então ambientes atemporais que podem servir de representação de qualquer tempo. Há até um certo desleixo quando em duas cenas há um mesmo maquinário ao fundo que aparenta ser contemporâneo, nos tirando, sem muito esforço, do filme.

Allon tenta criar, em um primeiro momento, um drama romântico que custa a ser enxergado por conta da distância em que as personagens são filmadas e pela total falta de afinidade e química entre elas. Percebendo isso ele se utiliza de técnicas mais objetivas, como o uso de close-up, para que entendamos o que está nas entrelinhas, no que não é falado. Nesse sentido, da ideia do não revelado, o filme até que consegue alinhar com as consequências dessa descoberta, trazendo consigo, então, uma justificativa razoável, mas, aparentemente, sem querer, do processo silencioso que fora construído em cima do relacionamento de Martha e Juliana.

Ainda em cima dessas ideias que não conseguem se estabelecer corretamente no filme, vemos uma forte intenção do diretor em pontuar essa quebra da cafeicultura no norte do Paraná, tendo a grande geada como um fator preponderante, mas não único. Existe, ainda que bem superficialmente, o relato da chegada de outros cultivos como a soja. Mas são cenas bem aleatórias e que não se traduz em nenhuma importância para a trama. O mesmo acontece com a geada, pois mesmo que o diretor repita diversas vezes sobre o perigo da geada, seja através do texto das personagens, ou pelas notícias que ouvimos pelo rádio, em momento algum vemos ela se concretizar em cena.

De forma similar os desenhos dos personagens sofrem do mesmo problema. A eles faltam clareza e coesão das suas histórias, mesmo dentro daquele pequeno recorte. Ainda que ao final tenhamos um núcleo feminino fortalecido, até este momento o que percebemos é uma história caminhando sem muita ordem ou organização e, simplesmente, acontecimentos sendo colocados em tela sem a preocupação de fazer sentido.

O Sol das Mariposas é um filme extremamente prejudicado por um roteiro pobre, personagens sem carismas e técnicas mal utilizadas. Como não poderia deixar de ser, o filme se coloca, então, como uma experiência esquecível.

AS NOITES AINDA CHEIRAM A PÓLVORA (2024)

Neste documentário, o diretor Inadelso Cossa, faz uma tentativa, beirando o experimental, de um filme sensorial para nos contar a história de seu país e em como seu povo foi forjado através de muita luta, resistência e resiliência.

Dois anos após a Guerra de Independência de Moçambique, um outro conflito aconteceu, a Guerra dos Dezesseis Anos (A Guerra Civil Moçambicana). Estima-se que esta guerra vitimou mais de um milhão de pessoas e, até hoje, ainda está a derramar sangue com os vários civis tendo que ter seus membros amputados por conta das minas terrestres (um legado maldito desta guerra)

O filme em si, que mescla entre uma tentativa de ficcionalizar juntamente com momentos de relatos de pessoas que viveram àquela época, se perde, justamente, ao não focar na sua estrutura. Para piorar o diretor claramente não tinha material suficiente que justificasse um longa de 92 minutos. A entrevista com sua avó, por exemplo, se torna uma grande lacuna para o filme, pois não há fluidez nessas cenas e sequer as informações possuem relevâncias. Tudo o que é dito, da forma como é dita, se torna vazio.

Filmado boa parte durante a noite, Inadelso encontra nesse aspecto outro grande problema, pois um filme que já não consegue se traduzi devido a um texto pouco conciso, tem na imagem a mesma confusão. Não sabemos ao certo o que estamos assistindo e de que forma cada cena dialoga umas com as outras. É na verdade uma grande colcha de retalho que, por trás, tem uma motivação justa, uma busca por levar aquela história a mais pessoas, mas que ao fim continua igualmente distante para aqueles que assistem.

O RANCHO DA GOIABADA, OU POIS É MEU CAMARADA FÁCIL, FÁCIL NÃO É A VIDA (2024)

Este é um dos títulos mais longos e prolixos que já vi ser dado para um filme. Esta brincadeira feita parece que respinga, também, no filme propriamente dito. Guilherme Martins, diretor e roteirista, coloca um personagem, vivido pelo ator Alex Rocha, como um ser andante. Ele conseguirá pendular entre o campo e a cidade dotado de certa malícia para enfrentar o dia a dia seja como vendedor ambulante de dvd’s de filmes brasileiros, ou como auxiliar de cozinha ou, até mesmo como boia-fria em uma plantação de cana.

Um dos maiores problemas desse filme é a utilização do humor. Este elemento está em todo o filme, pois o protagonista, afirmadamente, possui essa característica. O filme consegue arrancar algumas risadas, mas em determinados momentos, o tom extrapola e chega a ser ofensivo. Há cenas em que a ofensa é externada pelos diálogos, como quando Alex está em um momento de folga da cozinha com outros funcionários e, fumando no muro, começam a falar de uma mulher que está passando por eles. É no mínimo deselegante que um filme se predisponha a criar uma cena dessa com um intuito claro de estabelecer uma ideia de normalização desse ato. Em uma outra cena, esta de maneira mais sutil, vemos o protagonista sentado enquanto que um senhor está de pé trabalhando sem parar em um canavial. Essa composição, para mim, foi extremamente ofensiva e desrespeitosa. De um total despropósito para um filme que se predispõe, em tese, mesmo que por um viés mais leve, a salientar sobre as dificuldades impostas e vividas pelo nosso povo, seja no campo ou na cidade.

O Rancho da Goiabada tenta se levar muito a sério, mas sem uma justificativa sincera para tal. O discurso, ainda que sintamos a presença de alguma relevância, se perde no espaço. Essa grande salada que o diretor faz, confiando em seu protagonista e que o mesmo seja o único responsável por conseguir juntar todos os elementos dessa história contada, para que então a fluidez e coesão sejam encontradas não me pareceu a melhor escolha. Como disse o personagem se perde dentro do próprio personagem. E aquele que deveria nos guiar, acaba nos levando para lugares duvidosos.

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