Herege (2024) é lançado num tempo em que os filmes de suspense estão escassos no cinema. Podemos dizer que é um longa que flui entre o gênero de terror, o suspense e o thriller psicológico.
Dirigido por Scott Beck e Bryan Woods, roteiristas de Um Lugar Silencioso (2018), conta a história de duas jovens missionárias de uma religião muito conhecida por tentar converter seguidores “porta-a-porta” no mundo todo. Irmã Paxton (Sophie Thatcher) e irmã Barnes (Chloe East) estão em mais uma missão que foram designadas, numa cidade desconhecida, e vão parar na porta do então aparentemente muito simpático e solícito Mr. Reed. A fé das missionárias estará sendo colocada à prova nessa fatídica visita de conversão.
O longa começa muito interessante com diálogos ácidos entre as garotas sobre acontecimentos ditos como “pecado” para a religião e, com isso, vai desenrolando muito bem até a chegada na casa do misterioso homem, interpretado por Hugh Grant, de Um Lugar Chamado Notting Hill (1999). A cenografia é de cores frias, sombrias e esverdeadas, criando um clima de tensão gélida e transmitindo até um ar de tradicionalismo na casa, o que engana inicialmente Paxton e Barnes – e também o espectador. Como poderemos suspeitar de um cheiroso bolo de amoras ofertado por um solícito senhor amigável?
Conforme os minutos vão passando, descobriremos a verdadeira e sagaz face de Mr. Reed. É um homem totalmente sarcástico e manipulador; envolvendo as pobres garotas num jogo de manipulação e controle, o personagem vai justificando todo esse jogo e comparando com a própria castração das religiões dogmáticas.
Simultaneamente a esse show de suspense, vemos algumas referências totalmente explícitas, como o documentário Zeitgeist (2007), que disserta sobre a vida de Jesus Cristo considerada um verdadeiro plágio de antigos mitos como Hórus (que também é filho de uma virgem) e Mitra, que teria nascido no dia 25 de dezembro. A cena da escada do porão é mais um exemplo de referência cinematográfica de outro filme, Creep (2014); além da semelhança do figurino do Mr. Reed com Jeffrey Dahmer – óculos redondo e suéter quadriculado.
As teorias são diversas, misturando o documentário sobre o mito Jesus, o hermético “somos nós o nosso próprio Deus” e uma conspiração sobre seres robóticos que querem dominar os humanos com a religião. Conforme o tempo vai passando, as cenas vão migrando para o terror, perdendo um pouco daquele suspense e o longa vai decaindo, cansando o espectador com as intermináveis teorias de conspiração do personagem de Hugh Grant. Teorias que são, por muitas vezes, mais inacreditáveis que os próprios mitos ditos no filme.
Hugh Grant se saiu muito bem, mesmo Herege sendo mediano. O ator, antes galã dos anos 1990 e 2000, mais conhecido por obras de comédia romântica, interpreta com maestria Mr. Reed, com suas feições maliciosas e ótima expressão corporal fazendo esquecer todo aquele ar de mocinho de seus famosos filmes; o seu sorriso maléfico gela nossa espinha em cena.
Por fim, Herege entrega um trabalho mediano em questão de roteiro, com tomadas prolongadas, o que pode cansar os mais apressados, boa atuação do vilão e direito à música do Radiohead. O filme nos leva a uma boa reflexão sobre dogma, manipulação religiosa e o que é o controle; revela que o terror religioso não é somente sobre possessões, demônios, padres exorcizando e toda essa “parafernália” que nós já conhecemos, e sim como a psicologia e a obscuridade da religião trazem reflexões sobre nossa vida.
Filme: Herege (Heretic) Elenco: Hugh Grant, Sophie Thatcher, Cloe East Direção: Scott Beck, Bryan Woods Roteiro: Scott Beck, Bryan Woods Produção: EUA Ano: 2024 Gênero: Terror/Suspense Sinopse: Duas jovens missionárias acabam presas na casa de um homem misterioso e são forçadas a participar de um jogo macabro, que desafia sua fé e sua crença. Classificação: 16 anos Distribuidor: Diamond Films Streaming: Indisponível Nota: 7,0 |