CRÍTICA – A FESTA NUNCA TERMINA

CRÍTICA – A FESTA NUNCA TERMINA

Apesar de falhar espetacularmente em ter uma narrativa verídica do jeito que filmes biográficos geralmente requerem, A Festa Nunca Termina se tornou uma improvável obra-prima ao capturar a essência da cena musical e de clubes de Manchester ao longo dos anos 1980 e 1990 por meio de uma de suas figuras mais icônicas, Tony Wilson. No entanto, o filme deixa bem claro que, mesmo sendo o protagonista, essa história não é sobre Wilson, mas sim sobre o movimento das bandas que surgiram ao redor dele criaram, suas histórias e impacto.

Como a maioria das histórias relacionadas ao movimento punk aconteceram, tudo começou quando Tony Wilson (Steve Coogan), um repórter de Manchester, assistiu a um show dos Sex Pistols, o que o convence a se envolver na cena musical da cidade. Junto a alguns amigos, decide criar uma gravadora, chamada Factory em homenagem a Andy Warhol, lançando bandas como Joy Division, New Order, Happy Mondays e The Durutti Column. O filme é uma jornada mostrando o desenvolvimento das bandas em relação a Factory e a Haçienda, clube formado pela gravadora, que se tornou palco de grandes bandas e foi primordial na expansão da cultura de rave no Reino Unido.

No intuito de quebrar os padrões tão conhecidos dos filmes biográficos, ou biopics, A Festa Nunca Termina usa uma história que não é estritamente verdadeira, mas faz isso com avisos ao público, utilizando-se da quebra da quarta parede para trazer essa versão de Tony Wilson e de pessoas envolvidas na Factory (com Howard Devoto, dos Buzzcocks, fazendo uma das cenas mais engraçadas) e nos contar que o que vemos provavelmente nunca aconteceu, mas em razão do entretenimento está ali.

O longa pode parecer sem rumo em alguns momentos, mas isso forçou o diretor Michael Winterbottom a se reinventar e não se deixar levar apenas por participações especiais, anedotas e músicas boas. Utilizando como base a estética criada por Peter Saville para a Factory, o diretor conseguiu fazer uma história divertida e atemporal, concretizando a própria concepção da hacienda, que teve sua criação baseada no texto de Gilles Ivain Formulário para um Novo Urbanismo “Não verás mais a hacienda. Ela não existe. É preciso construir a hacienda”. O conceito da hacienda não é um local específico, mas sim um lugar que precisa ser construído a cada geração e que permite que as pessoas criem algo novo. 

É interessante mencionar que esta é a primeira colaboração de Steve Coogan e Rob Brydon com o diretor Michael Winterbottom, parceria que posteriormente resultou na série de filmes Uma Viagem Excêntrica (The Trip) e na adaptação do “infilmável” Tristram Shandy: A Cock and Bull Story. Com seis filmes (e um sétimo em produção este ano), essas colaborações também seguem alguns dos padrões que funcionaram tão bem em A Festa Nunca Termina, como a quebra da quarta parede, presença contínua de alguns atores e a linha tênue entre a realidade e a ficção (algo que se torna o principal diferencial dessas produções). 

Steve Coogan tem um longo histórico como ator de comédia, sendo Alan Partridge um de seus personagens mais conhecidos, e seu trabalho como Tony Wilson se destaca por conseguir balancear os elementos cômicos com as partes dramáticas, sem perder o carisma nem a atenção do espectador. O elenco de apoio conta com Sean Harris, John Simm, Ralf Little e Tim Horrocks como membros do Joy Division/New Order, que conseguem, de forma conjunta, evidenciar a personalidade dos componentes da banda e expor como eram as relações entre eles, algo feito com evidente respeito, especialmente em tributo à memória de Ian Curtis.

De forma extremamente inovadora, mas sem se afastar de seus objetivos, o longa de Michael Winterbottom utiliza da nostalgia, que se espalhou rapidamente com o fim da Haçienda e da falência da Factory, para estabelecer o legado e a importância dessas bandas, que até hoje são grandes influências na música, criando uma das biografias mais divertidas do século 21.


Filme: A Festa Nunca Termina (24 Hour Party People)
Elenco: Steve Coogan, Paddy Considine, Sean Harris, Shirley Henderson
Direção: Michael Winterbottom
Roteiro: Frank Cottrell Boyce
Produção: Reino Unido
Ano: 2002
Gênero: Biografia, Comédia, Drama
Sinopse: Em 1976, Tony Wilson, um repórter em Manchester, Inglaterra, organiza festas em clubes locais para lançar bandas independentes. Com o sucesso, torna-se empresário musical, abrindo a lendária gravadora Factory, e muda o cenário musical da época.
Classificação: 18 anos
Distribuidor: Pathé
Streaming: Indisponível
Nota: 8

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