CRÍTICA – A MARAVILHOSA HISTÓRIA DE HENRY SUGAR

CRÍTICA – A MARAVILHOSA HISTÓRIA DE HENRY SUGAR

A Maravilhosa História de Henry Sugar (The Wonderful Story of Henry Sugar, 2023) é o primeiro de quatro curtas-metragens realizados por Wes Anderson e baseados na obra de Roald Dahl, que chegaram ao catálogo da Netflix nos últimos quatro dias de setembro.

Wes Anderson, que lançou neste mesmo ano seu décimo primeiro longa-metragem, Asteroid City (2023), entrega, com Henry Sugar mais uma de suas obras tão características. A forma, que é um dos traços mais fortes do trabalho do cineasta, está como nunca apresentada aqui em um filme visualmente perfeito e autorreferencial.

A narrativa de Henry Sugar de início pode parecer um tanto caótica, muito pelo modo com o qual a montagem do filme apresenta os personagens e seus enredos. O curta-metragem, que tem cerca de 39 minutos de duração, apresenta ao menos três histórias diferentes e a narração fica por conta do “protagonista” de cada uma delas. Há, ainda, o próprio Roald Dahl, interpretado por Ralph Fiennes (A Lista de Schindler, 1993), que nos introduz ao conto que ele mesmo escreveu.

Para quem está já familiarizado aos filmes de Wes Anderson, há uma certa surpresa ao não encontrar, aqui, a maioria dos colaboradores habituais do diretor. Ralph Fiennes é, talvez, o único ator que reprisa a colaboração após O Grande Hotel Budapeste (2014). No elenco de Henry Sugar estão Benedict Cumberbatch (Ataque dos Cães, 2021) no papel título, Dev Patel (Quem Quer ser um Milionário?, 2008), Ben Kingsley (A Lista de Schindler, 1993) e Richard Ayoade (Paddington 2, 2017). Vale dizer que a parceria é bastante frutífera e os atores cabem perfeitamente em seus papéis.

A característica mais marcante desse curta-metragem está na rapidez do roteiro narrado. Se desviar um pouco a atenção, o espectador pode perder partes importantes da trama, que acompanha a vida de um homem rico e vazio que, ao descobrir o relato sobre um homem que enxergava sem usar os olhos, resolve aprender seus “truques” para ganhar ainda mais dinheiro.

A narrativa se amarra através da história desse personagem (Ben Kingsley) – literalmente – de circo, do médico que teve contato com ele (Dev Patel) e de Henry Sugar, que acabou tendo em mãos as anotações desse médico. É visível, no texto ditado pelos personagens, que há uma espécie de moral por trás da história, que vai pelo caminho da redenção de um indivíduo antes desprezível, que através da concentração em um objetivo fútil encontrou uma motivação válida para sua vida.

É importante mencionar que o foco narrativo do enredo de Anderson está não na narrativa em si, mas na forma em que o espectador a apreenderá. Em todos os segmentos de Henry Sugar, ouvimos os personagens, de maneira bastante teatral, narrarem suas ações e mesmo o cenário se transmuta de acordo com o que é narrado. A experiência que se tem ao assistir é como a de ler um livro e imaginar o texto, como fazemos normalmente, porém Wes Anderson a transforma em um sentimento compartilhado entre realizador e espectador, como se estivéssemos realmente lendo um livro, só que juntos.

Falar sobre as cores e a simetria no cinema de Wes Anderson soa quase como uma redundância, uma vez que tais características tiveram e ainda têm papel importante na popularização dos filmes do realizador. Posso dizer com tranquilidade que Anderson é um dos meus cineastas favoritos e que é sempre um prazer assistir a qualquer um de seus filmes. Ainda assim, acredito que há muitas pessoas que se incomodam pelas cores altamente saturadas e quentes utilizadas na quase absoluta maioria de seus filmes, exceto por seu trabalho de estreia Bottle Rocket: Pura Adrenalina (1996).

Pensar o cinema de Anderson através somente da forma e apreciá-lo pelo deleite da simetria é válido, pois filmes são também entretenimento, porém, não podemos reduzir seus trabalhos meramente à forma. O projeto estético dos filmes de Wes Anderson, ao aliar as imagens e roteiros muitas vezes pitorescos, é responsável por trazer discussões muitas vezes de natureza existencial, com personagens que muito têm a dizer além da perfeita sincronia de suas falas, seus figurinos e o enquadramento dentro do cenário.

A Maravilhosa História de Henry Sugar abre a pequena coletânea de curtas-metragens sobre o universo do escritor Roald Dahl, que teve obras adaptadas no cinema como A Fantástica Fábrica de Chocolate (1971; 2005), O Fantástico Senhor Raposo (2009) – também de Wes Anderson –, Matilda (1996), entre outros. A adaptação de Wes Anderson, além de homenagear o escritor ao representá-lo em seus filmes narrando e contextualizando o espectador à obra que se segue, cria uma obra importante tanto visualmente e esteticamente quanto como puro entretenimento.


Filme: The Wonderful Story of Henry Sugar (A Maravilhosa História de Henry Sugar)
Elenco: Benedict Cumberbatch, Ralph Fiennes, Dev Patel, Ben Kingsley, Richard Ayoade.
Direção: Wes Anderson
Roteiro: Wes Anderson
Produção: EUA
Ano: 2023
Gênero: Aventura, Drama, Fantasia
Sinopse: Henry Sugar faz de tudo para dominar uma técnica extraordinária para trapacear nos jogos de azar.
Classificação: Livre
Distribuidor: Netflix
Streaming: Netflix
Nota: 8,3

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