CRÍTICA – EU NÃO ME IMPORTO SE ENTRARMOS NA HISTÓRIA COMO BÁRBAROS

CRÍTICA – EU NÃO ME IMPORTO SE ENTRARMOS NA HISTÓRIA COMO BÁRBAROS

Antes de tudo, os registros históricos continuam a alimentar debates até os dias atuais, mesmo possuindo a validação de historiadores, acadêmicos e da própria sociedade, um bom exemplo são as narrativas da Ditadura no Brasil. A história é periodicamente reexaminada para dissecar suas narrativas desde o início até o ponto culminante – esse ponto culminante frequentemente permanece na memória coletiva e é revivido em discussões modernas. Dentro deste contexto, a obra “Eu Não Me Importo se Entrarmos para a História Como Bárbaros” assume o papel de guia, seguindo os passos dos personagens, mas principalmente Mariana, em suas interações íntimas com a história da Romênia. Elementos que foram outrora relegados ao esquecimento agora recebem sua devida atenção, graças a luta da personagem. Ela almeja reencenar em praça pública, o terrível episódio do massacre antissemita de 1941 na Romênia, conferindo visibilidade a páginas previamente sepultadas da história.

É curioso notar como, logo na primeira cena do filme, após as imagens de arquivo, os personagens estabelecem uma conexão intrínseca com a narrativa de conflito, cujas raízes remontam muito antes de 1941. Ioana Jacob, ao dar vida a Mariana, dá início à trama apresentando uma equipe de filmagem reduzida e armamentos proeminentes. Esses elementos são habilmente destacados para que os espectadores possam discernir os elementos constituintes da história da Romênia. Nesse contexto, minha mente é inundada por imagens de disparos violentos, fileiras de inocentes e ditadores desfrutando de conforto em seus espaços.

Antes de mergulharmos na história paralela de Mariana, é importante mencionar o diretor do filme, Radu Jude, cuja presença não foi explicitada no texto. Esses dois mundos, ficção e realidade, colidem quando os personagens se confrontam visualmente com material histórico. A abordagem de Jude é notavelmente diferente da abordagem dramática intensa que vemos, por exemplo, em “A Lista de Schindler”, conforme aludido em diálogos. Em vez disso, os momentos dramáticos são substituídos por interações comuns entre personagens e movimentos de câmera que parecem despreocupados com a força do material em cena. Tanto o diretor quanto os personagens, assim como nós, espectadores, testemunham imagens que não causam mais impacto devido à sua constante exposição. Portanto, é natural questionar por que os personagens reagiriam com surpresa diante de “mais um massacre”. No decorrer do nosso cotidiano, acompanhamos a inundação de notícias sobre mortes em nossos dispositivos, e nossa resposta mais frequente é um simples “Onde isso aconteceu?”.

Após enfrentar tentativas de censura, deslegitimação de autoridades, representação de homens em seu estado patético, e ainda momentos de resiliência testemunhados em uma simples banheira, a apresentação pública se desenrola em paralelo com a maneira pela qual o material gravado por Radu Jude se apresenta: de forma caseira, metalinguística e permeada por uma ironia sutil. 

O cenário do teatro popular é composto por imagens e discursos impactantes. Contudo, o que chama a atenção é a reação da população frente a um massacre: em vez de respostas enérgicas, vemos selfies sendo tiradas e fotos sendo capturadas para alimentar seus próprios veículos de comunicação. Conforme a apresentação chega ao seu desfecho, Mariana experimenta uma sensação de satisfação. Mesmo que sua mensagem tenha sido interpretada de maneira divergente, ela compreende que deixou uma marca indelével naquela praça pública. Dessa vez, a narrativa é genuína e a Romênia terá que viver com essa insatisfação na história. 


Filme: I Do Not Care If We Go Down in History as Barbarians (Eu Não me Importo se Entrarmos para a História como Bárbaros) 
Elenco: Ioana Iacob, Alex Bogdan, Alexandru Dabija, Ion Rizea, Claudia Ieremia. 
Direção: Radu Jude
Roteiro
: Radu Jude
Produção
: Romênia, República Tcheca, Alemanha, Bulgária e França
Ano:
2018
Gênero:
Drama
Sinopse:
A diretora Mariana (Ioana Iacob) planeja relembrar os compatriotas do antissemitismo da nação através de uma reencenação em praça pública, mas realizar de fato a apresentação, encomendada como uma homenagem aos soldados, revela-se um tremendo desafio.
Classificação
: 18
Distribuidor
: Micro Film
Streaming:
Indisponível
Nota
: 9,0

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