CRÍTICA – LONGLEGS: VÍNCULO MORTAL

CRÍTICA – LONGLEGS: VÍNCULO MORTAL

A crise criativa no cinema mainstream, especialmente no gênero de horror, é cada vez mais evidente. As recentes produções de sucesso comercial revelam uma falta de originalidade. A indústria se acomodou em uma repetição cansativa de temas, personagens e estilos narrativos. Em vez de buscar inovação, parece reciclar incessantemente fórmulas já gastas, com diálogos que soam como se fossem produzidos por uma máquina de clichês. Há poucos esforços em oferecer surpresas ou cativar o público de forma genuína. Longlegs: Vínculo Mortal

No passado, o cinema evoluiu graças ao esforço conjunto de produtores e artistas. Suas visões conflitantes geravam soluções inovadoras para momentos de crise. Através desses confrontos criativos, surgiram revoluções tecnológicas, temáticas e estéticas que transformaram a experiência cinematográfica. O advento do som, as vanguardas artísticas, a consolidação de Hollywood, o surgimento do High Concept e o cinema de fluxo são exemplos marcantes dessas inovações.

Mas depois de tantos marcos históricos, a pergunta que fica é: ainda é possível trazer algum tipo de inovação?

Dentro desse contexto, Longlegs: Vínculo Mortal (2024) surge como um indício de que essa sequer é a prioridade atual da indústria. Estrelado e coproduzido por Nicolas Cage, o filme não traz novas abordagens, seja narrativa, estética ou temática. De forma consciente, ele se mantém amarrado a convenções exploradas em demasia. Começando pelo antagonista, um serial killer com motivações desconhecidas, traços satânicos e uma personalidade excêntrica. Assim, segue os mesmos clichês de vilões já vistos inúmeras vezes, sem qualquer tentativa de subversão.

O enredo traz Lee Harker (Maika Monroe), agente do FBI designada para investigar uma sequência de eventos envolvendo o assassinato de crianças. Ao longo da trama, ela desenvolve uma conexão pessoal, estranha e inquietante, com o antagonista Longlegs (Nicolas Cage). O avançar da trama vai revelando os detalhes dessa relação, permitindo também o andamento da investigação. Essa dinâmica nos remete, pela similaridade, à relação entre protagonista e antagonista que vimos anteriormente em O Silêncio dos Inocentes (1991). A relação entre os personagens enriquece a narrativa com uma complexidade emocional que intensifica o suspense e a tensão.

O modo de atuação do serial killer, seguindo padrões rígidos e meticulosamente elaborados, evoca influências claras de filmes como Seven – Os Sete Crimes Capitais (1995) e Jogos Mortais (2004). Em ambos os exemplos, os vilões seguem regras e rituais complexos que não apenas moldam suas ações, mas também estruturam a narrativa. Seus feitos se conectam como peças de um quebra-cabeça a ser desvendado. Essa abordagem eleva ainda mais o suspense.. Cria-se um jogo psicológico entre o antagonista e a protagonista, que deve decifrar as pistas para que a narrativa possa progredir.

O ponto é que Longlegs, ao optar pela simplicidade, não alcança o impacto de seus predecessores. Nem tenta estabelecer uma conexão complexa com suas referências. Em vez disso, limita-se a reciclar fórmulas já conhecidas. Os produtores preferem repetir métodos comprovados em thrillers sem se preocupar em redefinir os padrões ou dar um novo significado aos elementos da história ou à interação com o público. Utiliza-se os estereótipos de forma exagerada e forçada para se encaixar nas convenções do gênero. Mas a experiência, embora familiar, atende às expectativas do público e mantém o suspense ao longo da trama.

Ainda que Longlegs não consiga se destacar pela densidade, nem busque ser inovador no conceito do gênero, ele se esforça para proporcionar uma experiência imersiva dentro do seu tempo de projeção. Se, assim como tantos outros, o filme estiver destinado ao esquecimento com o tempo, devido às suas escolhas e abordagem, seu foco está nos 101 minutos de entretenimento que proporciona.  Neste sentido, seu mérito deve ser ressaltado. É entregue uma investigação instigante, sustentada por decisões visuais que contribuem para uma atmosfera envolvente. E a partir do momento que estabelece essas premissas, a coisa parece funcionar.

A presença de Nicolas Cage é constantemente aguardada pelo espectador, e o filme brinca com essa expectativa. Ao adiar e encurtar seus momentos em tela, aumenta-se o ar de mistério. Além disso, escondido atrás de uma maquiagem intensa e uma interpretação extremamente caricata, Cage aposta na irreconhecibilidade como uma forma de se desviar do estigma de que é um ator ruim. Embora eu não concorde com essa visão, seus últimos papéis parecem carregados de um autojulgamento por parte do próprio ator, indicando uma busca, que é reforçada aqui, de redefinir sua imagem e escapar das críticas. É interessante acompanhar o desafio de Cage em se reinventar e tentar surpreender o público, dando uma nova dimensão à experiência.

Infelizmente, o filme leva ao pé da letra a ideia de que só o tempo de projeção importa. Isso é confirmado ao oferecer um final repleto de eventos, mas com pouco impacto duradouro. A última cena é marcada por uma abordagem estéril, tecnicamente eficaz, mas desprovida de emoção. Esse desfecho , embora não deva nada à trama, contrasta com a atmosfera cuidadosamente desenvolvida ao longo do filme e com a própria tradição do horror. Como resultado, a experiência do espectador tende a se dissipar rapidamente, e o retorno à realidade é quase imediato. Dessa forma, o próprio destino de esquecimento do filme é reforçado.

Certamente, ao evitar enfrentar a crise de criatividade e se concentrar apenas na experiência durante o tempo de projeção, Longlegs consegue encontrar seu espaço. Além disso, ao possuir pouca relação com um caso real e se situar no passado, o longa escapa da necessidade de tratar seus temas de maneira profunda ou com uma perspectiva atualizada. Em vez disso, oferece uma experiência consistente e envolvente, concentrada na ficção e no entretenimento. Essas decisões permitem o êxito do filme, alinhado com a sua proposta.

No entanto, embora esse enfoque tenha permitido ao filme ganhar destaque momentâneo, ele falha em se firmar no tempo. Como resultado, é condenado a uma breve existência e ao inevitável esquecimento. Pelo menos, entretém enquanto dura.


Filme: Longlegs (Longlegs: Vínculo Mortal)
Elenco: Maika Monroe, Nicolas Cage, Blair Underwood, Alicia Witt
Direção: Oz Perkins
Roteiro: Oz Perkins
Produção: Estados Unidos
Ano: 2024
Gênero: Thriller
Sinopse: Uma agente recruta do FBI é designada para o caso de um serial killer. À medida que o caso dá voltas complexas, ela descobre uma conexão pessoal com o impiedoso assassino.
Classificação: 18 anos
Distribuidor: Diamond Films
Streaming: Indisponível
Nota: 6,0

 

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