CRÍTICA – MEU CASULO DE DRYWALL

CRÍTICA – MEU CASULO DE DRYWALL

Em Meu Casulo de Drywall, a diretora Caroline Fioratti realiza sua obra mais autoral. Habituada com a abordagem juvenil, este seu mais recente projeto até possui uma cadeia de personagens com a mesma idade dos protagonistas de seus últimos filmes mais comerciais. Contudo, a abordagem aqui é bem mais matura e carregada por uma atmosfera austera que traz forte inquietação em tudo que permeia os jovens da classe rica no Brasil.

Montado de forma não linear, somos apresentados à um fluxo incontínuo que tem como núcleo principal a festa promovida por adolescentes pertencentes à classe alta brasileira, para comemoração dos 17 anos de Virgínia – até que eventos bizarros desencadeiam-se. E vale dizer que, como um filme sugestivo, os paliativos como a ambientação e a estética se revelam bem mais estimulantes do que as próprias reflexões.

Mesmo com um ecossistema envolto pelo que seriam figurinhas carimbadas da novela Malhação, é mérito total de Fioratti tornar desse natural afastamento de identificação, um ponto de partida para gerar estranheza e uma atmosfera sólida de incômodo. A vibe noturna e o sentimento constante de depressão juvenil fazem jus à inspiração em Sofia Coppola. Ademais de uma composição de mise-en-scene exemplar, a montagem não linear é um glamour que engrandece toda a abordagem e contribui na consolidação da singularidade aplicada pela diretora, fugindo da previsibilidade formal de muitos filmes brasileiros tematicamente semelhantes, enquanto amplia um universo instigante rodeado por consternação e dúvida.

Com exceção da leitura de parentalidade, que é composta por pais excessivamente caretas e detentores de um moralismo forçado e caricato, os adolescentes são objetos de cena observados sempre com profundidade pelas lentes, pondo-os como figuras complexas, em processo de assumir seus privilégios e da morbidez que seu elitismo espalha na sociedade. Com isso, a bolha em que vivem passa a ser palco de ansiedade enquanto as águas vão ficando sempre mais agitadas.

Pode ser despertada aversão nos mais imperceptíveis gestos cometidos por àquelas pessoas ricas responsáveis por gerar uma energia austera e opressora – apartamentos luxuosos e diálogos que naturalizam um abismal afastamento da realidade da enorme maioria da população brasileira. E a medida que o suspense avança, fica no ar perante ambiguidade a presença onírica de algum fator sobrenatural: afinal, a ferida que vai literalmente se abrindo na pele de Virgínia ao longo da festa é ou não fruto de uma força lírica maior?

Diferenciado em sua firme construção de mundo, Meu Casulo de Drywall é a entrada mais relevante na carreira da diretora Caroline Fioratti, com uma corrente de personagens e de acontecimentos apreensivos moldados numa atmosfera por vezes etérea e que estranheza e incômodo ecoam a morbidez da classe alta brasileira. Pecando apenas por possuir uma reflexão final menos potente do que a própria moldura e construção, a experiência, por mais que apenas ganhe moral ao ser compreendida tratar-se de ser uma crítica à elite, é, no mínimo, singular.


Filme: Meu Casulo de Drywall
Elenco: Maria Luísa Mendonça, Bella Piero, Michel Joelsas, Mari Oliveira, Daniel Botelho, Caco Ciocler, Debora Duboc, Flávia Garrafa, Marat Descartes, Lena Roque
Direção
: Caroline Fioratti
Roteiro: Caroline Fioratti
Produção: Brasil
Ano: 2024
Gênero: Drama
Sinopse: Virgínia comemora os seus 17 anos com uma festa em sua cobertura. Apesar de tudo aparentemente perfeito, Virginia não consegue ignorar a ferida que cresce com o correr das horas. O dia seguinte nasce como uma tragédia que abala o condomínio. Virgínia está morta. Patrícia, sua mãe, vive o luto quase a ponto de enlouquecer. Luana se questiona se é culpada pelo destino da melhor amiga. Nicollas tenta ignorar a morte da namorada refugiando-se em sexo casual com funcionários. E Gabriel carrega o peso de um segredo e de uma arma.
Classificação: 18 anos
Distribuidor: Gullane
Streaming: Indisponível
Nota: 7,5

Sobre o Autor

Share

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *