CRÍTICA – MISSÃO IMPOSSÍVEL 7

CRÍTICA – MISSÃO IMPOSSÍVEL 7

Em Missão Impossível – Acerto de Contas Parte 1, Ethan Hunt (Tom Cruise) e sua equipe são acionados para uma perigosa e importante missão, impedir uma Inteligência Artificial (IA), denominada “A Entidade”, de tomar controle do mundo. 

Retornando ao começo de Missão Impossível

No sétimo filme da franquia, Christopher McQuarrie parece querer propor um encerramento para a saga que remeta a uma espécie de nostalgia ao início da franquia de Ethan Hunt e seus companheiros. Tal nostalgia evoca um sentimento de retorno às origens, apresentando-se de maneira  com que emaranhe-se ao filme tanto em um aspecto formal quanto conteudista. 

Se McQuarrie almejava uma finalização simbólica para Missão Impossível, um regresso ao passado era certamente uma das possibilidades; e foi o caminho adotado pelo diretor. Portanto, a trama de Missão Impossível – Acerto de Contas Parte 1 leva Ethan Hunt a um encontro com o que para ele já era longínquo, a pessoa que o tornou quem é hoje. 

Apesar de tal questão não ser o mote principal do filme, é o mote principal do protagonista. Ethan enfrenta dilemas e questões éticas, morais e profissionais que permeiam seu passado e seu presente; assim como o futuro de todo o mundo. McQuarrie acaba, portanto, estabelecendo dinâmicas dramáticas que paralelamente iniciaram e encerrarão a história do personagem. 

A Inteligência Artificial em 2023

Entretanto, o antagonista da trama, remete não ao passado do personagem de Cruise, mas à contemporaneidade mundana. Inegavelmente, em 2023, existe uma assustadora neblina que cobre os caminhos futuros com incertezas, um medo palpável do desconhecimento da participação da Inteligência Artificial em nosso próprio futuro e nossos próprios papeis como constituintes de uma sociedade. Conforme, tal medo é espelhado na obra, que estabelece uma IA como a grande vilã do filme.

Desse modo, Missão Impossível – Acerto de Contas Parte 1 remove o véu da incerteza para revelar um trajeto decadente, uma ameaça global. Porquanto, para McQuarrie, o local para onde a IA nos levará, como conjunto social, está mais para um círculo do inferno de Dante do que para um paraíso abençoado. Há até uma piadinha no filme sobre isso, quando Benji (Simon Pegg) diz que já era sabido por todos o destino final da utilização de IA. 

As inverdades de Missão Impossível (e do cinema)

Assim, o grande antagonista do filme assume essa faceta de algo metafísico. Em outras palavras, existe, mas não existe. É corpóreo, mas não é. Tem rosto, mas não tem. Tem nome, mas não tem. Analogamente, estabelece-se um grande paralelo com o próprio protagonista, Ethan Hunt. Afinal, Ethan é um espião secreto de uma agência secreta. Ou seja, existe, mas não existe. Rola inclusive uma cena, no início do filme, na qual o líder da IMF (Impossible Mission Force) se refere ao personagem de Cruise como alguém sem face e sem nome.

Nesse sentido, acaba ocorrendo novamente uma retomada do começo. A saga Missão Impossível teve seu início cinematográfico com um protagonista fantasma, existe mas não existe. Do mesmo modo, seu último inimigo adquire as mesmas características. Características estas que, primordialmente, sem elas não existiria Missão Impossível para começar; é uma obra que habita a dimensão sombria das verdades e mentiras, do falso e do real. 

Por fim, acaba sendo bem simbólico para com o próprio cinema, a tão aclamada sétima arte. O cinema é o mundo das inverdades. Em outras palavras, é o reino da mentira. A saber, o cinema é a arte de contar mentiras de maneiras interessantes o suficiente para não nos importarmos se são mentiras. Ou seja, o cinema é o habitat natural de todas as coisas que existem, mas não existem. E Missão Impossível, inegavelmente, não nos deixa esquecer isto; desde seu primeiro capítulo,  pelas mãos do maravilhoso, louvável, extraordinário, Brian de Palma. O primeiro filme da saga não nos deixa esquecer nunca o seu emaranhado de mentiras, com suas lúdicas interações entre máscaras, segredos e espiões; assim como Missão Impossível – Acerto de Contas Parte 1 também não deixa. É o regresso ao começo no começo do fim.

A forma cinematográfica de Christopher McQuarrie

Christopher McQuarrie, nessa primeira parte do final da franquia, parece mesclar os seus trejeitos nos últimos filmes com alguns formalismos mais presentes no início da saga. Do mesmo modo como assumia uma abordagem mais frontal com o cinema de ação nos filmes mais recentes da saga, o diretor continua de tal maneira aqui. Entretanto, McQuarrie adquire uma estilização bem técnica e dramática. Isto é, o diretor utiliza-se de seus planos, ângulos, foco e movimentos para evocar sensações diferentes no espectador.

Aliás, o filme até remete a De Palma neste aspecto. O diretor do primeiro Missão Impossível usa e abusa de tais aspectos imagéticos para construir uma vertigem alucinógena de emoções, brincando com suas imagens. McQuarrie parece querer ir para esse lado, deixando sua obra repleta de planos holandeses (aquela câmera torta), jogos com contraplanos, planos fechados — incluindo uma luta super claustrofóbica em um beco, de prender a respiração —, e outras questões assim.

Uma obra nostálgica e contemporânea

Todavia, é curioso como ao mesmo tempo que retorna ao De Palma na tecnicidade da câmera, parece querer ser lúdico com algumas questões que no primeiro filme eram mais presentes; como os gadgets dos espiões. Claro, em Missão Impossível – Acerto de Contas Parte 1 ainda temos dispositivos e máscaras, mas seu uso é mais discreto, algo mais detalhista do que um foco primordial (como De Palma fazia). Rola até uma dinâmica no filme que força os personagens a ficarem sem alguns dispositivos por medo deles serem invadidos pela IA inimiga.

Dessa maneira, McQuarrie constrói um filme que consegue dialogar bem com a essência da franquia. Em suma, mantém alguns trejeitos que já se tornaram característicos e principais na saga, mas também retoma e remete algumas questões ao início da mesma. É um filme frenético e emocionante, que conseguirá agradar novos e antigos fãs; ao mesmo tempo que pavimenta o caminho para uma despedida que não queremos nos despedir.


Pôster do filme "Missão Impossível - Acerto de Contas Parte 1", de Christopher McQuarrie. Filme: Mission: Impossible – Dead Reckoning Part One (Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte 1)
Elenco: Tom Cruise, Hayley Atwell, Ving Rhames, Simon Pegg, Rebecca Ferguson, Vanessa Kirby, Esai Morales, Pom Klementieff
Direção: Christopher McQuarrie
Roteiro: Christopher McQuarrie, Erik Jendresen
Produção: Estados Unidos
Ano: 2023
Gênero: Ação
Sinopse: Ethan Hunt (Tom Cruise) e sua equipe são acionados para uma perigosa e importante missão, impedir uma Inteligência Artificial (IA), denominada “A Entidade”, de tomar controle do mundo.
Classificação: 14 anos
Distribuidor: Paramount Pictures
Streaming: Não disponível
Nota: 9,0

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