O Luto dos Outros (The Grief of Others, 2015) é um filme que já se apresenta de forma peculiar. O longa-metragem de Patrick Wang – adaptado do romance de Leah Hager Coen – se debruça sobre uma família que passa pelo luto. Com uma narrativa quebrada e por vezes confusa, Wang conduz o espectador por dentro de uma dinâmica familiar despedaçada pela perda recente e pelas consequências do acontecido.
Nesta primeira experiência com o cinema de Wang, pude perceber alguns padrões que permeiam essa obra em específico. Há diversas marcas da direção que acredito serem uma forma do autor de se inscrever em seu próprio trabalho. Sabendo que o luto é um tema em recorrência em suas produções, percebe-se sua tentativa de transpor para a tela o sentimento daqueles personagens a partir do trauma. Dessa maneira, a confusão de emoções, a apatia e até mesmo a raiva confluem entre si, enquanto o espectador adentra o pequeno universo da família Ryrie.
O luto que vem no título do filme já nos informa do conteúdo da produção, porém, a medida em que os minutos vão se passando, pouco sabemos sobre este luto de fato. A chave da narrativa de Wang está na apresentação daquela família que está seguindo sua rotina “normal” como se nada tivesse acontecido. Quanto mais normalidade esses personagens tentam passar em suas ações, mais as consequências são sentidas.
É importante mencionar que aqui não há uma explosão ou clímax narrativo. É claro que, à medida que a história avança e somos apresentados mais profundamente aos personagens em tela, descobrimos, junto com eles, alguns segredos que permeiam o seu infortúnio. As duas crianças, que pouco entendem sobre luto e muitas outras instâncias da vida, são aquelas com a maior sensibilidade, talvez, para lidar com o caso.
A filha mais nova dos Ryries, que mata aula todos os dias para elaborar rituais para elevar a alma de seu irmão que sequer chegou a conhecer, é a primeira personagem a ser apresentada, em uma sequência que em toda a sua duração é estranha e desconfortável, mas que abre as portas para o universo compartilhado com os outros personagens também estranhos. A partir disso, o longa-metragem de certa forma situa o espectador de que ali não se encontrará uma obra de fácil apreensão, tanto quanto a personalidade da pequena Biscuit.
O ponto de virada na vida dessa família se dá quando a filha mais velha e de outro casamento do pai, aparece em sua porta pedindo para ficar por alguns dias. O que de cara se parece somente com uma visita comum, se transforma à medida que a família descobre o motivo da jovem estar ali. Essa personagem funciona, dentro da narrativa, como a ligação entre os Ryries e o mundo “exterior”. Da mesma forma que nós, espectadores, assistimos ao desmoronamento daquele núcleo familiar, Jessica acompanha de dentro o caos silencioso do ambiente que aos poucos começa a lhe tragar para o seu centro também.
De maneira geral, a história gira em torno de um bebê nascido com má formação e que acabou não sobrevivendo, e a partir desse acontecimento, a narrativa vai se desenhando. Não é um problema de fato, mas há um certo incômodo na forma com a qual as imagens de O Luto dos Outros são elaboradas. As transições entre cenas e as sobreposições de imagens parecem fora de tom e não acrescentam muito à narrativa, ainda que sejam usadas para marcar o tempo das ações representadas e seus flashbacks.
Para mim, talvez, o maior incômodo tenha sido a cena final do filme de Wang. Após acompanhar todo o decorrer daquela narrativa, acredito que seu desfecho não foi exatamente satisfatório, uma vez que ele pareceu exagerado e até um pouco forçado. De certo modo, é como se o filme tivesse sido dividido em dois e, ainda que tenha havido pontos sugestivos e direcionados àquele momento, ao final, ele se apresenta somente como mais um clichê inserido em um filme alternativo.
De todo modo, o luto é um sentimento, um estado, que somente aqueles que já passaram podem dizer como realmente ele se dá. Vendo de fora, a abordagem em O Luto dos Outros não gera nenhuma simpatia por nenhum dos personagens ou por sua situação. Na verdade, o sentimento final, após o fim dos créditos, é que a narrativa truncada do filme girou em torno de si mesma, não se importando em dar alguma essência ou mesmo desenvolvimento a família apresentada.
Filme: The Grief of Others Elenco: Wendy Moniz, Trevor St. John, Oona Laurence, Sonya Harum, Jeremy Shinder, Mike Faist. Direção: Patrick Wang Roteiro: Patrick Wang Produção: EUA Ano: 2015 Gênero: Drama Sinopse: O bebê de um casal morre 57 horas após o seu nascimento. Seus pais tentam voltar para as suas vidas anteriores e lutam para recuperar uma aparência de normalidade para si e seus dois filhos. Classificação: 14 anos Distribuidor: Grasshopper Film Streaming: Filmicca Nota: 6,0 |