CRÍTICA – OS JOVENS BAUMANN

CRÍTICA – OS JOVENS BAUMANN

Os Jovens Baumann (2018) retrata as férias de um rico grupo de herdeiros em uma propriedade rural em Minas Gerais, durante o ano de 1992. Entretanto, o que poderia ser uma sequência de diversões encontra um fim triste e assombroso. Existe no filme um certo quê lúdico, sobretudo na maneira como brinca com um misto de nostalgia e desconforto. A escolha em retratar o found footage em VHS é um dos principais responsáveis por isso. 

A imagem mórbida de Os Jovens Baumann

Sendo assim, pode-se começar atestando que Os Jovens Baumann (2018) é uma tragédia anunciada até mesmo através de seu formalismo. Aqueles jovens, que contemplamos em sua divertida viagem, são declarados como desaparecidos desde o início da obra; não resta dúvidas quanto a isso. Dessa maneira, cria-se um tom extremamente inquietante na atmosfera do filme; um desconforto de saber que algo muito ruim está para acontecer. Paralelamente, a utilização do VHS brinca com tal ideia. Afinal, em uma época de streaming e video on demand, a fita cassete basicamente não existe mais. 

Quando Bruna Carvalho Almeida, a diretora, nos faz assistir algo em VHS, é como se assistíssemos a um cadáver, algo que não mais é. Sendo assim, tais trechos do filme adquirem um caráter extremamente mórbido. Analogamente, tão mórbido quanto ver aqueles jovens, dos quais também sabemos que não existem mais. Nesse sentido, é a declaração da iminência da tragédia tanto em seu conteúdo quanto em sua forma.

A saudade do que já foi

Contudo, os momentos found footage de Os Jovens Baumann (2018) também trazem uma nostalgia acolhedora. Uma vez que a própria tecnologia utilizada intrinsecamente desperta isto. Como um profissional da área de tecnologia, este que vos escreve está perfeitamente ciente das facilidades providas pelo avanço tecnológico. Entretanto, mazelas também se acarretaram. Inegavelmente, em um mundo cada vez mais veloz e conectado, nossas preocupações e anseios estão cada vez mais presentes e tangíveis. Redes sociais novas surgem a cada dia (alô, Threads), reuniões no Meet, emails corporativos, aplicativos travados. Tudo acontecendo paralelamente e em uma velocidade maior do que conseguimos conceber.

Em outras palavras, a tecnologia facilitou nosso cotidiano, mas elevou à enésima potência a maneira com a qual nos conectamos com ele e, consequentemente, com seus problemas. Deste modo, a lembrança (e o vislumbre) do VHS remete a um tempo mais simples. Um tempo onde não precisávamos ficar perdidos entre milhões de opções nos streamings. Um tempo onde não precisávamos ficar checando nosso Discord e email pós-horário de trabalho com medo de ter algum pepino urgente pra receber. Uma época onde a vida não era vivida em várias esferas ao mesmo tempo, mas sim no presente próprio.

A amizade como uma ferramenta massificadora

Igualmente, as dinâmicas dos personagens remetem à tal nostalgia. Enquanto os parentes se divertem, não há preocupações. Afinal, um mundo onde se pode brincar no mato, fingindo ter encontrado um ovo de dragão, parece um mundo muito mais calmo, não? Outrossim, as relações entre eles são extremamente naturais e, até, infantis. Bruna Carvalho Almeida faz com que seja possível sentir na pele a amizade e o carinho entre o grupo, é tudo extremamente natural.

Entretanto, ao mesmo tempo que eles funcionam muito bem como grupo, pecam como indivíduos, é tudo uma mesma coisa. Isto é, é difícil diferenciar um personagem do outro e suas personalidades. Não me recordo nem o nome de todos — nem ao menos quantos eram, para ser honesto.

Contudo, pelo foco da diretora ter sido apontado mais para a unidade do grupo e suas dinâmicas e relações, é um sentimento muito acalorado contemplá-los em suas brincadeiras e descontrações. Novamente, remete a um tempo mais simples. Um tempo onde podia-se sumir para o meio do mato com seus amigos e se divertir sem precisar pensar se vai precisar acordar cedo amanhã ou não. Dessa forma, essa dualidade estabelecida, entre a morbidez da tragédia vindoura e a emoção da simplicidade nostálgica, conseguem tornar tudo ainda mais desconfortável e inquietante. Uma vez que as coisas se desenrolam de tal maneira, desperta-se um sentimento quase profano. Sente-se mal por estar vendo tais imagens, poderia ser um crime.

O presente e o passado

Os Jovens Baumann (2018) seria um baita filme se focasse nestes aspectos e no referido desconforto. Não apenas inquietaria seus espectadores, mas marcaria seu posto em um local onde habitam filmes dos quais não desejamos reassistir — e isso seria uma coisa boa. Entretanto, Bruna Carvalho Almeida deseja estabelecer um mistério maior em torno do núcleo de seu filme. A diretora traz mesclas do found footage com pedaços de um tempo presente, através de uma narradora em off que comenta sobre o caso, colocando-se, inclusive, no local. 

Todavia, o recurso da narradora contemporânea, soa muito deslocado. Decerto, sua presença na obra faz com que a dualidade sentimental estabelecida pelo found footage seja quebrada. O fluxo de emoções sentido é interrompido cada vez que ela aparece. Da mesma forma, a função da personagem acaba sendo meio vazia. Afinal, a narradora acaba por apenas colocar em palavras tudo que a própria imagem do VHS já nos diz. Seria menos problemático se presença da mesma fosse apenas isto, um vazio desnecessário, que não acrescenta nem retira. Entretanto, a personagem atrapalha.

Sob o mesmo ponto de vista já dito anteriormente, a narração quebra a vertigem de emoções trazida pelo found footage. Mas, não só isso, uma vez que a mesma também é utilizada para tentar trazer um mistério e um suspense maior a respeito do caso. Contudo, não existe suspense. Afinal, Os Jovens Baumann (2018) deixa bem translúcido o destino daqueles jovens. A narradora, portanto, fica dando murro em ponta de faca, querendo criar uma tensão que não leva a lugar algum — no final, o destino dos jovens nem é de fato mostrado.

O desconforto das imagens em Os Jovens Baumann

Em suma, Os Jovens Baumann (2018) é um filme que tem muita força em suas imagens. As escolhas estéticas e formais da diretora trabalham com o discurso conteudista para corroborar no espectador um sentimento extremamente forte e positivamente negativo. Conquanto, parece não acreditar na força de seu próprio cinema e se rende a crença da necessidade do acréscimo de uma personagem que, embora tenha sido criada para, supostamente, potencializar o efeito da obra, só faz por minar o próprio vigor.


Pôster do filme "Os Jovens Baumann", de Bruna Carvalho Almeida. Filme: Os Jovens Baumann
Elenco: Julia Burnier, Isabela Mariotto, Marília Fabbro, Anna Santos, Caiña Vidor, Daniel Mazzarolo, Eduardo Azevedo, Juliana Moretti, Julio Braga
Direção: Bruna Carvalho Almeida
Roteiro: Bruna Carvalho Almeida, Larissa Kurata
Produção: Brasil
Ano: 2018
Gênero: Suspense
Sinopse: Um rico grupo de herdeiros vai passar suas férias em uma propriedade rural em Minas Gerais, durante o ano de 1992. Entretanto, o que poderia ser uma sequência de diversões encontra um fim triste e assombroso.
Classificação: 12 anos
Distribuidor: Vitrine Filmes
Streaming: Itaú Cultural Play
Nota: 6,0

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