Quando um ator vence um Oscar, existem alguns caminhos que podem ser seguidos. Leonardo DiCaprio, por exemplo, após ganhar a desejada estatueta, passou 3 anos sem trabalhar em nenhum projeto, sendo o próximo um filme de Tarantino em que ele foi novamente indicado. Já Nicolas Cage, por outro lado, acabou aceitando qualquer projeto que vinha pela frente, adicionando algumas bombas à filmografia inclusive. Cilian Murphy optou pelo caminho de usar sua visibilidade para alavancar e viabilizar projetos menores.
Pequenas Coisas Como Estas é um filme irlandês, terra natal de Murphy, dirigido pelo pouco conhecido Tim Mielants, que trata, teoricamente, sobre abusos sofridos por jovens garotas em um convento de freiras no interior do país. Mas, para quem desconhece os fatos históricos, talvez sequer se perceba a densidade do evento. Isso porque o arrastado longa de Mielants tem tanta dificuldade de prender o espectador, que parece não respeitar a delicadeza da própria história.
Tal qual os denominados “oscar-baits” – que são filmes feitos com o objetivo de ser “a cara” da temporada de premiações adotando elementos apelativos, como tecnicismos sofisticados, atuações com métodos de transformação, patriotismo e emotividade esterilizada –, existem também os baits de festivais. Pequenas Coisas Como Estas se encaixa perfeitamente nessa classificação. É um filme que propaga um ar “reflexivo” e “cult”, mas é pedestre ao acreditar que está alcançando algo que nunca alcançará. Sequer é razoável em termos de progressão e imersão narrativa, contendo uma montagem previsível e datada, com flashbacks e uma tentativa de comoção através de um método de calmaria e um ar pseudo melancólico.
É tão fajuta a tentativa que diversos momentos que deveriam ser sérios, acabam sendo enfadonhos. Por exemplo: a esposa do protagonista, “preocupada” com a situação financeira (um fato que almeja incluir solidariedade, mas nitidamente é um caminho fácil de acrescer empatia), está em 90% do tempo com uma cara e voz de choro. Chega a banalizar, já que não há nenhum desenvolvimento que implique coerência nesse excesso. O diretor britânico Mike Leigh, expert em tratar famílias em situação de vulnerabilidade econômica e em gerar uma dor genuína, ficaria ofendido com o quão rasteiro é a dinâmica assinada por Mielants. Os flashbacks, encaminhados como telenovela e dirigidos de forma cafona, só tornam tudo mais demorado e antipático.
E precisamos falar do mal aproveitamento de Murphy. Veja, ele costumeiramente faz sim personagens fechados, calados,porém aqui é tudo tão sonolento que sua ausência de diálogos chega a incomodar. É uma atuação interessante, porque Murphy sempre irá se dedicar aos seus trabalhos, mas parece que o desenvolvimento do filme não está se importando tanto quanto ele. É uma história tão ofuscada que parece esbranquiçada, sem um ponto de ignição e muito menos um de reflexão genuína.
O filme parece apenas sussurrar suas intenções, com preguiça e sem foco para conseguir nos amarrar. Essa irresponsabilidade tira qualquer peso real e joga tudo para a “importância temática”. O insulto começa ao achar que por estar fazendo um filme socialmente relevante se está produzindo um filme digno. A dedicatória no final (por sinal, mais um ponto genérico) não deveria ser um critério de relevância, mas sim deveria ser levado em conta o tratamento da linguagem cinematográfica, que parece não ser do conhecimento de Mielants. O entorpecente roteiro faz da personagem de Emily Watson, uma freira, algo muito mal escrito, apenas para projetar a força antagônica batata e chegando a gerar antipatia pela boa atriz.
Acreditando possuir força apenas pela pressuposta relevância social (“o inferno está cheio de boas intenções”), Pequenas Coisas Como Estas é um filme que parece um enorme primeiro ato entediante e que acredita estar discutindo temas importantes enquanto, na verdade, almeja apenas ser premiado em festivais. Apenas pincela a ideia de que pessoas boas podem deixar coisas ruins acontecerem, papeia sobre o suplício da redenção e fala sobre estar perdido na escuridão – nada é trabalhado. Esse diretor tem muito o que aprender ainda.
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Filme: Small Things Like These (Pequenas Coisas Como Estas) Elenco: Cillian Murphy, Emily Watson, Michelle Fairley, Eileen Walsh, Zara Devlin, Clare Dunne, Helen Behan, Ella Cannon, Patrick Ryan, Peter Claffey, Ian O’Reilly, Sarah Morris Direção: Tim Mielants Roteiro: Enda Walsh Produção: Bélgica, Irlanda, EUA Ano: 2024 Gênero: Drama Sinopse: Enquanto trabalha como comerciante de carvão para sustentar sua família, Bill Furlong descobre segredos perturbadores guardados pelo convento local e revela suas próprias verdades, forçando-o a confrontar seu passado e o silêncio cúmplice de uma pequena cidade irlandesa controlada pela Igreja Católica. Classificação: 12 anos Distribuidor: O2 Play Streaming: Indisponível Nota: 2,0 |