CRÍTICA – RESISTÊNCIA

CRÍTICA – RESISTÊNCIA

Missão Impossível 7 – Parte 1 estreou como o filme “mais 2023 possível”, pois no centro da trama estava um submarino naufragado e uma inteligência artificial. Neste último tema, o ano em questão tem sido marcado pelas IAs e discussões em torno do seu uso, assim como acontece sempre quando surge alguma tecnologia nova que promete quebrar paradigmas. Contudo, não é de agora que esse tema aparece nos cinema. Nos anos 80, Exterminador do Futuro já trazia esta pauta no centro da narrativa. Neste século, Ela, A.I – Inteligência Artificial do Steven Spielberg e After Yang conferiram novas abordagens, perspectivas e nuances para a discussão em como nos relacionamos com essas novas tecnologias. Por isso, Resistência, de Gareth Edwards (Rogue One), chega com a expectativa de discutir as IAs num contexto em que elas estão cada vez mais sendo inseridas em nosso cotidiano.

No universo do filme – num futuro não tão distante –, as inteligências artificiais estão evoluídas e completamente inseridas no dia-a-dia de toda a sociedade. Muitos trabalhos humanos como babás, caixas de supermercado e até mesmo soldados foram substituídos por robôs. A tecnologia era uma grande aliada das nações até que uma ogiva em Los Angeles é disparada por uma inteligência artificial e mata mais de 1 milhão de pessoas.

Após o ataque terrorista, as organizações sociais se transformaram por completo, com o Ocidente (leia-se Estados Unidos) em guerra com a Inteligência Artificial, enquanto humanos e robôs vivem e resistem às investidas americanas no Oriente — chamado de Nova Ásia. Aqui ficam muito claras as analogias que o texto de Edwards e Chris Weitz fazem sobre as guerras causadas pelas intervenções americanas em outros países (Iraque, Coreia, Afeganistão, Vietnã e etc…) e paralelos ao terrorismo e suas conspirações (mais precisamente o 11 de setembro).

É inegável a força temática do material em mãos. O problema é que Edwards e Weitz não desenvolvem essas discussões para além de uma base estrutural. Muitas dessas ideias, por sinal, parecem que foram esquecidas “na nuvem” já que elas são levantadas para o público pensar, mas nunca realmente discutidas. O roteiro opta por focar nos dramas de Joshua (John David Washington), um ex-soldado das forças especiais em luto após o desaparecimento de sua esposa grávida (Gemma Chan) durante uma missão em que estava infiltrado para localizar e destruir “O Criador”. Depois do incidente que colocou em risco a missão, Joshua é novamente recrutado, agora para capturar uma arma desenvolvida pela IA avançada capaz de acabar com a guerra e destruir toda a humanidade.

Nessa jornada recheada de mistérios, ele acaba descobrindo muito mais sobre a guerra sim e sua família. Uma de suas descobertas, por exemplo, é que a tal máquina é, na verdade, uma criança robô apelidada de Alphie (Madeleine Yuna Voyles), que passa a acompanhá-lo quando a sua equipe se vira contra Joshua e os dois são perseguidos por todos os lados. 

A dinâmica entre os dois remete um pouco a de Joel e Ellie em The Last Of Us e é o que faz o filme funcionar dramaticamente, pois é dessa relação que surgem os melhores momentos, conduzida por um funcional e não tão inspirado John David Washington e pela atriz mirim que em alguns momentos entrega atuação de gente grande.

Ainda que seja uma aventura genérica, que não acrescenta em praticamente nada a discussão em torno das IAs avançadas e do comportamento geopolítico dos Estados Unidos; deixando a desejar narrativamente, Resistência ao menos é a comprovação de que o diretor Gareth Edwards é um dos diretores que melhor sabe utilizar efeitos visuais na atualidade. Visualmente o longa é impecável, certamente um dos melhores trabalhos do ano nesse quesito, elevado pela fotografia incrível de Greig Fraser (The Batman) e Oren Soffer. É impressionante o resultado com “apenas” 80 milhões de dólares (bem menos da metade de Flash, por exemplo). A construção visual do mundo é riquíssima e, com uma campanha certa, pode aproveitar o vácuo deixado por Duna – Parte 2 para beliscar um Oscar de Melhores Efeitos Visuais. 

Por outro lado, a excelente execução desses efeitos esbarra numa talvez falta de inspiração conceitual em fazer algo mais autoral. A construção de mundo é muito derivativa em alguns momentos por utilizar referências muito claras de Star Wars, Eu, Robô e Blade Runner e deixando ele menos memorável do que podia ser. Além disso, muito pouco dele é mostrado além das pequenas vilas, naves e algumas locações, o que não ajuda também. É entendível que Resistência optou por seguir um lado mais intimista e se apoiar na relação entre Joshua e Alphie, mas para uma ficção científica funcionar é necessário que o universo criado seja sólido. Tanto que essa falta de solidez prejudicou o longa narrativamente, pois tudo parece ser muito superficial e confuso. 

Resistência é um ótimo exemplo de filme com uma premissa interessante, visual incrível mas com pouquíssima profundidade narrativa e com decisões criativas equivocadas e despropositadas (como dividir o longa em capítulos), que mais atrapalham do que ajudam o longa a se firmar e conquistar quem assiste. No final, é só mais uma aventura com cenas de ação insossas com um potencial temático atual desperdiçado.


Resistência - poster

Filme: The Creator (Resistência)
Elenco: John David Washington, Allison Janney, Gemma Chan, Ken Watanabe, Sturgill Simpson e Madeleine Yuna Voyles
Direção: Gareth Edwards
Roteiro: Gareth Edwards e Chris Weitz
Produção: Estados Unidos
Ano: 2023
GêneroFicção Científica, Ação
Sinopse: Em um futuro distante, em meio a uma guerra entre humanos e as forças da inteligência artificial, Joshua, um ex-agente das forças especiais que sofre com o desaparecimento de sua esposa, é recrutado para caçar e matar o Criador, o desconhecido arquiteto da avançada Inteligência Artificial que desenvolveu uma misteriosa arma com o poder de acabar com a guerra… e com a própria humanidade. Joshua e sua equipe de agentes de elite ultrapassam as linhas inimigas, rumo ao centro do sombrio território ocupado pela IA, apenas para descobrir que a arma que acabará com o mundo, e que ele foi instruído a destruir, é uma Inteligência Artificial na forma de uma criança.
Classificação: 12 anos
Distribuidor: Walt Disney Studios
Streaming: Indisponível
Nota: 6,0

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