CRÍTICA – SEM AR

CRÍTICA – SEM AR

Em “The Dive (Sem Ar)”, Max Erlenwein nos presenteia com uma obra cinematográfica que vai além do suspense e mergulha nas profundezas da psicologia humana, levando o espectador a uma experiência envolvente e reflexiva. A trama começa de forma aparentemente simples: duas irmãs, May e Drew, embarcam em uma viagem de mergulho em alto mar. Contudo, o que parece ser uma aventura tranquila rapidamente se transforma em um pesadelo quando um catastrófico deslizamento de terra as deixa presas sob as rochas, abaixo da superfície oceânica.

Usando seus códigos narrativos para criar metáforas, o desenho de som, criado por Corinna Fleig e Michael Schlömer, é um dos destaques de “Sem Ar”. Os sons da bola e até dos movimentos dos personagens na água, permitem que o espectador antecipe a importância crucial do oxigênio na trama que se desenrola. Essa substância vital, responsável por fornecer o ar indispensável, representa, por sua vez, um poderoso símbolo de resiliência. Não por acaso, a personagem repete frequentemente em um momento de desespero: “Quanto mais calma, menos ar consome.” Além disso, as intensas respirações das personagens desempenham um papel essencial na transmissão da tensão que permeia não só o momento tenso em que estão passando, como permeiam suas vidas como um todos. É notável como a mixagem sonora prioriza esse elemento, destacando-o em detrimento de outros, e, com isso, intensifica a experiência do espectador.

Assumindo diversas conotações, o título do filme de cara evoca uma metáfora que ilustra as complexidades do relacionamento entre as irmãs e a profunda tortura psicológica que May enfrenta ao atribuir a culpa pela morte do pai à sua irmã. Erlenwein efetua essa exploração de maneira habilidosa, ao entrelaçar cenas de flashback envolvendo as duas irmãs com momentos do presente ao longo de toda a narrativa. Gradualmente, o diretor revela os elementos contextuais dessa relação. O mérito dessa abordagem reside especialmente no fato de que ela não necessita de exposição explícita; simplesmente por meio das imagens e das cenas de flashback, com diálogo escasso, já se desvelam não apenas os eventos passados, mas também o estado mental de May.

Capturando esse aspecto de maneira vívida, há uma cena em questão que chama a atenção. Logo no início, enquanto ambas se encontram em uma espécie de caverna submersa, Drew indaga sua irmã sobre o grau de satisfação que ela experimenta com o passeio. Mesmo com uma feição entediada, ela responde de maneira afirmativa, entretanto, logo após, se retira da caverna, ficando em completa solidão. Nesse preciso momento, as pedras desabam sobre as irmãs. Essa bela metáfora, ao se manifestar, introduz, de forma sutil, ao espectador a intensa tensão psicológica que permeia as personagens.

Outra cena importante é quando as duas compartilham do mesmo cilindro de oxigênio, dividindo o mesmo ar para garantir a sobrevivência, como se a relação corroída pela perda do pai estivesse gradativamente se reestabelecendo. A competente fotografia de Frank Griebe desempenha um papel igualmente essencial, proporcionando não apenas planos de grande beleza visual, mas também contribuindo significativamente para a narrativa. Um exemplo marcante ocorre quando May se encontra à beira do afogamento, adentrando em um estado de alucinação induzida pelo excesso de nitrogênio. Nesse momento, o ambiente se obscurece por completo, com apenas a luz de seu capacete acesa, deixando visível apenas o rosto de May, enquanto o restante se perde na escuridão, como se May estivesse se esvaindo não só daquele mundo, mas abandonando todo aquele trauma que a corroía até então.

Além disso, a montagem se mostra eficaz ao alternar entre o desespero de May e os esforços de Drew em busca de ajuda. A inclusão estratégica das cenas de flashbacks é realizada com equilíbrio, mergulhando até mesmo em um breve surrealismo que harmoniza perfeitamente com a visão do diretor. Sua grande proeza reside na forma como conduz a metáfora subjacente, tecendo-a habilmente na trama, fazendo-nos refletir sobre as profundezas do sofrimento humano. Ainda que no final o roteiro encontra uma resolução um pouco fácil, ainda assim é um filme que diverte.


Filme: The Dive (Sem Ar)
Elenco: Louisa Krause, Sophie Lowe, Stella Uhrig, Shire Richardson, David Scicluna
Direção: Maximilian Erlenwein
Roteiro: Maximilian Erlenwein e Joachim Hedén
Produção: Alemanha
Ano: 2023
Gênero: Thriller
Sinopse: Duas irmãs fazem um mergulho em um local remoto e deslumbrante. Uma das irmãs é atingida por uma rocha, ficando presa a 28 metros de profundidade. Com níveis perigosamente baixos de oxigênio e temperaturas frias, cabe à sua irmã lutar pela sua vida.
Classificação: 12 anos
Distribuidor: Paris Filmes
Streaming: Indisponível
Nota: 7,0

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