“Os Caras Malvados” é a mais recente animação da DreamWorks dirigida por Pierre Perife. Na interpretação brasileira temos Babu Santana, Sergio Guizé, Agatha Moreira, Nyvi Estephan e Luis Lobianco. O filme nos envolve na história de uma quadrilha formada por cinco animais que cometem os maiores roubos e agora precisam resistir, ou não, à tentação de se tornarem dóceis.
Sabemos que as animações infantis, sobretudo quando se tratam de contos milenares, o que não é o caso do filme aqui em questão, preservam-se com o papel de apresentar ludicamente às crianças noções como altruísmo, gentileza, nobreza e outros ideais de caráter e comportamento. Porém, em sua maioria, o fazem de forma relativamente óbvia e simplista, evitando sugerir, por exemplo, que o mundo não é unilateral. Talvez o maior ponto positivo do filme “Os Caras Malvados” é a inteligência instigante e uma narrativa que cumpre seu papel de entreter e trazer boas lições sem ser nada superficial. É capaz de agradar facilmente adultos e crianças com sua ludicidade e humor atual. Para nossa surpresa, o roteiro do filme traz na sua base reflexões sem uma única versão ou resposta. Nada que o torne pesado ou angustiante, é claro. Mas proporciona junto com o entretenimento algum conteúdo mais consciente e consistente aos olhos mais ou menos atentos.
“Os Caras Malvados” trata sobretudo das aparências e do abismo entre palavras, atitudes e intenções. Um grupo de delinquentes que aceita a proposta de ir a uma espécie de “spa para bandidos” onde um porquinho-da-índia super altruísta que inveja a Madre Teresa os espera para transforma-los em animais bons, dóceis e, claro, honestos. Através daí o filme nos leva a uma viagem onde nem tudo é o que parece. Aliás, como dizem as avós, “Nada é de todo mal, nada é de todo bem”. Aquele que parece representar a própria escória pode sim ter agir com ética e algum respeito. E mais: isso não tem nada a ver com ideologias. Muito pelo contrário. O filme nos surpreende justamente quando estamos certos que belas palavras formam um belo caráter e um belo ser.
Definitivamente o filme não reproduz as noções simplistas de bem e mal, herói/heroína e vilã/vilão, certo e abominável. Essas camadas criadas pela estrutura do roteiro que, embora seja a conhecida “Jornada do Herói”, consegue entre os atos e pontos não reproduzir a obviedade dos clichês que tornam muitos filmes os mesmos com apenas vozes, cenários e traços da animação diferentes mas tendo entre si os mesmos pressupostos e esgotamentos.
Como já foi dito, a animação servirá bem às variadas faixas etárias. Os adolescentes naquela clássica fase de introspecção podem se identificar com o Sr. Cobra (voz de Sergio Guizé) e suas emoções soterradas em um coração molinho. Além de simpatia e algumas gargalhadas, ele também gera uma grande surpresa. Porque sim, um roteiro não tão previsível ganha muito mais confiança, interesse e atenção profunda de quem assiste. Acreditamos no que vemos sem julgar ser aquilo mais um artifício do roteiro que terá um resultado já previsível.
No Brasil, algo que pode chamar atenção no filme é a relação harmônica da sociedade formada por humanos e animais selvagens. Isso chama bastante atenção no momento no qual a sociedade civil brasileira precisa pressionar as autoridades para que elas não tomem medidas potencialmente ameaçadoras à sobrevivência humana e de grande parte do que conhecemos como fauna e flora. No entanto, nem de longe essa é uma questão explorada pelo filme, o que não faz mal.
Apesar do filme, bem como o grupo, se chamar “Os Caras Malvados”, há nele a Srta. Tarântula (voz de Nyvi Estephan) que é a hacker genial quem faz com que tudo seja possível em meio a tanta tecnologia. Ela e a Prefeita Diane Raposina (voz de Agatha Moreira) resolvem sozinhas um problema importantíssimo. A Prefeita Diane, autoridade maior, além de ser inteligente, elegante e gentil, mostra-se muito mais independente e poderosa do que pode parecer à primeira vista, ou no primeiro ato. Por outro lado, o filme traz também na personagem da chefe de polícia responsável por investigar e prender Os Caras Malvados, a já obsoleta figura da mulher poderosa que, para ser respeitada (e o filme não traz isso, nem precisaria), precisa ser durona e “raivosa”. Vale afirmar que não cabe aqui estabelecer as intenções por trás dos pontos anteriormente citados. O filme em si trata de diluir muitas dessas questões ou até mesmo deixar-nos incertos diante de tantas possibilidades.
Por fim, pode-se dizer que “Os Caras Malvados”, através de um roteiro bem alinhavado, com personagens expressivas e divertidas, consegue nos divertir sem perder a ternura de uma narrativa com saborosas camadas. A animação com traços comuns, não tão sofisticados da adaptação dos livros de Aaron Blabley, roteirizado por Etan Cohen e Hilary Winston mostra-se capaz de encantar adultos, adolescentes e crianças sem que precisem temer os esgotamentos e obviedades comuns a muitas animações. O filme deixa-nos uma lição muito positiva com suas surpresas.
Filme: The Bad Guys (Os Caras Malvados) Elenco: Sam Rockwell, Marc Maron, Craig Robinson, Anthony Ramos e Awkwafina Direção: Pierre Perifel Roteiro: Pierre Perifel Produção: Estados Unidos Ano: 2022 Gênero: Animação, Aventura, Comédia, Policial Sinopse: Um infame grupo de amigos é formado pelo batedor de carteiras Sr. Lobo (Sam Rockwell/Rômulo Estrela), o arrombador de cofres Sr. Cobra (Marc Maron/Sergio Guizé), o mestre do disfarce Sr. Tubarão (Craig Robinson/Babu Santana), o sorrateiro Sr. Piranha (Anthony Ramos/Luis Lobianco) e a hacker especialista Srta. Tarântula (Awkwafina/Nyvi Estephan). Depois de anos integrando a lista dos criminosos mais procurados do mundo, essa gangue finalmente é capturada. Agora resta ao Sr. Lobo negociar um acordo de liberdade; e para escaparem da prisão eles precisarão se tornar pessoas honestas e legais. Classificação: Livre Distribuidor: Universal Pictures Streaming: Indisponível Nota: 7,5 *Estreia dia 17 de março de 2022 nos cinemas* |