SNOW IN SEPTEMBER

SNOW IN SEPTEMBER

Direto de Ulaanbaatar

“Snow in September” (sem tradução oficial para o português; Neve em Setembro em tradução livre) é um curta-metragem que se passa na Mongólia. Ele acompanha Davka (Sukhbat Munkhbaatar), um adolescente aparentemente no ensino médio, mora em um antigo prédio de estilo soviético na capital da Mongólia, Ulaanbaatar. Anuka (Nomin-Erdene Ariunbyamba), sua colega de sala, mora no mesmo prédio. Eles voltam da escola juntos conversando sobre mangás e fazendo indiretas sexuais dignas de adolescentes. 

Em um desses dias, uma mulher mais velha (Enkhgerel Baasanjav) vê Davka na escada e, mais tarde, bate em seu apartamento. Ela diz morar no prédio e ter ficado trancada para fora. No tempo em que, em teoria, espera seu marido voltar para casa, o mundo de Davka e sua relação com as mulheres de sua vida mudam para sempre. 

Davka passa de um adolescente bobo com uma quedinha pela amiga da escola, brincando com o cabelo dela durante a aula, para um jovem marcado por uma experiência estranha. O que poderia ser o desabrochar de um romance adolescente entre Davka e Anuka se torna um momento forçado que acaba com a amizade dos dois. A relação próxima de Davka com sua mãe (Odgerel Bat-Orshikh) vai de afeto e contato físico para estranheza e distância.

A tradução do título do filme para o português seria Neve em Setembro. A Mongólia está no hemisfério norte. Com isso, quando estamos no inverno aqui, ela está no verão. Ou seja, neve em setembro é algo extremamente fora do usual, e é com essa cena que o filme termina. Aqui, para mim, demonstra o fim da inocência adolescente de Davka. O verão juvenil acabou e não voltará mais. 

 

20 minutos com maestria

Lkhagvadulam Purev-Ochir, a diretora e roteirista, aproveita muito bem os 20 minutos de filme. Em nenhum momento ela se esquece da máxima “show, don’t tell” (mostre, não conte) do cinema. Os diálogos são escassos e não fazem falta, a história toda se desenrola para além das palavras. Muito é deixado para a interpretação de quem assiste. 

O uso de luz natural faz com que o filme realmente seja como se nós, espectadores, fôssemos insetos na parede observando um crescer forçado. Nenhum aspecto do filme leva ao escapismo. Seus temas de adolescência, sexualidade e, aviso de spoiler!, abuso, são trabalhados de uma forma realista. 

Nesses 20 minutos, Purev-Ochir constrói um mundo cinza. É como se aquilo pudesse acontecer com qualquer um, e qualquer um pudesse fazer aquilo. Ela quebra as expectativas de como essas temáticas geralmente são trabalhadas no cinema. O abuso é inesperado, a violência gera violência, nada é glorificado, nada é maniqueísta. 

Por incrível que pareça, o filme que me veio à mente em comparação foi “As Vantagens de Ser Invisível”. Quem assistir os dois saberá o porquê. A diferença aqui aqui é que ninguém ganhou no fim do filme, e a vida às vezes é assim né? Nem tudo vai acabar colorido. 

 

Premiações

O curta-metragem ganhou o prêmio de Melhor Curta-Metragem na Bienal de Veneza, como parte do Venice Horizons Award. Ganhou também o IMDbPro Short Cuts Award for Best Film do Festival Internacional de Filme de Toronto. Ambas as premiações ocorreram em 2022. 

A diretora concorreu com seu curta anterior, Mountain Cat (2020), no prestigiado Festival de Cannes. Não só foi a primeira diretora mulher da Mongólia a ter um filme concorrendo em Cannes, mas também o primeiro filme da Mongólia no geral a concorrer em no seleto festival francês! Mountain Cat também foi selecionado para o Festival de Sundance, e foi premiado com o Sonje Award no Festival de Busan em 2020.  

Purev-Ochir participou do Torino Feature Lab, do Locarno Open Doors, fez seu mestrado no programa KinoEyes da União Europeia, e continua estudando a arte do cinema em seu doutorado. 

 

A Plataforma Festival Scope

Assistir este curta só foi possível graças à plataforma Festival Scope. É uma plataforma digital que hospeda diversos festivais de cinema ao redor do mundo. Recebi um e-mail avisando que alguns curtas do Festival de Veneza ainda estavam disponíveis e de forma gratuita. Se inscrevam também para receberem esses avisos, eles são enviados para todas as pessoas inscritas (ou seja, estou divulgando a plataforma por ser muito legal, e não por nenhum tipo de acordo de publicidade!). Nem sempre os filmes estão disponíveis para assistir a partir do Brasil mas, quando estão, é uma forma muito legal de acompanhar o que há de mais novo no mundo do cinema. Você pode acessar a Festival Scope aqui: https://www.festivalscope.com/ 

Still do filme Filme: Snow in September
Elenco: Sukhbat Munkhbaatar, Nomin Erdene Ariunbyamba, Enkhgerel Baasjanav, Odgerel Bat-Orshikh
Direção: Lkhagvadulam Purev-Ochir
Roteiro: Lkhagvadulam Purev-Ochir
Produção: Mongólia, França
Ano: 2022
Gênero: Drama
Sinopse: Davkaé um adolescente que vive em um prédio soviético decadente em Ulaanbaatar. Com sua colega de classe, Anuka, eles conversam sobre mangá e brincam um com o outro sobre sexo. Quando Davka encontra uma mulher mais velha, seus ideais sobre intimidade e sua visão sobre relacionamentos é forçada a mudar (do site da Bienal de Veneza 2022).
Classificação: 16 anos
Distribuidor: Bienal de Veneza
Streaming: Festival Scope, até 30 de setembro – https://www.festivalscope.com/page/venice-sala-web-2022/
Nota: 8,0

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