CRÍTICA – RIEN À PERDRE

CRÍTICA – RIEN À PERDRE

Ao expor as consequências da injustiça e as lutas dos personagens para superá-la, o cinema cria uma conexão emocional com o público, inspirando-o a questionar as normas estabelecidas e a buscar um mundo mais justo. As histórias de injustiça no cinema têm o poder de provocar debates, promover a conscientização e impulsionar a busca por mudanças significativas. No filme “Rien à perdre”, o tema da injustiça se manifesta no sistema de assistência social francês, retratando momentos em que esse sistema se revela despreparado para lidar com diversas questões, expondo as falhas e desafios enfrentados pelos personagens.

Dirigido por Delphine Deloget, Rien à perdre aborda temas como injustiça e resiliência, o filme conta a história. O filme se concentra na batalha de Sylvie para recuperar a custódia de seu filho que, sofreu um acidente doméstico quando estava só em casa sob os cuidados do seu irmão mais velho. Sylvie, então, se encontra numa posição de impotência, mas tenta a todo custo recuperar a guarda de seu filho mais novo.

Apesar do caos que permeia a vida dessa família devido ao fato de Sylvie ser uma mãe solteira e ter que trabalhar, deixando seus filhos sozinhos em diversas ocasiões, é evidente o afeto e o cuidado que eles compartilham mutuamente. Essa representação emocionalmente envolvente é fundamental, pois quando o filho, Sofiane, é tirado de sua mãe, o espectador de fato sente um senso profundo de injustiça e dor. A partir desse ponto, todas as cenas que envolvem a recusa de permitir que Sylvie recupere a custódia de Sofiane ou as tentativas de impedir que ela veja seu filho possuem um peso dramático poderoso. Essa intensidade emocional é reforçada pelas excelentes performances do elenco. Vale a pena destacar duas em particular.

Virginie Efira convence de forma impressionante no papel de uma mãe desesperada pela iminente perda da guarda de seu filho, transmitindo de maneira habilidosa a combinação de impotência e desespero. India Hair, que interpreta a assistente social, também se destaca, mesmo com poucos minutos de tela, ao trazer um certo cinismo para sua personagem. Com um tom calmo, ela tenta transmitir a sensação de estar agindo pelo bem do menino, mas com uma frieza imensa, minimizando e ignorando a dor da mãe.

No entanto, um dos aspectos problemáticos do filme é a inclusão de subtramas que não contribuem de forma significativa para o enredo principal. Um exemplo é a trajetória do filho mais velho, Jean-Jacques, que passa por diversas mudanças em sua vida. Inicialmente, vemos que ele é um talentoso trompetista, mas acaba desistindo do instrumento e abandonando uma apresentação antes mesmo de começar. Agora, seu interesse está voltado para a culinária e ele tem o desejo de se mudar para outra cidade para seguir essa nova paixão. Embora a intenção seja aprofundar o personagem, essa subtrama acaba não acrescentando quase nada ao filme como um todo. A falta de conexão com a trama principal e a falta de desenvolvimento adequado tornam essa subtrama desnecessária e pouco impactante para a narrativa.

Em outros momentos, Deloget insere acontecimentos que soam artificiais. Um exemplo disso ocorre quando Sylvie consegue um novo emprego como atendente de call center, uma posição arranjada por seu irmão. O chefe enfatiza a necessidade de alguém equilibrado e estável para o trabalho. Fica bastante óbvio que aquela função não é adequada para ela. Parece que o emprego é apenas uma oportunidade para que ela perca a paciência em algum momento, criando mais um elemento dramático no filme, com uma abordagem convencional e forçada. É previsível, por exemplo, que em algum momento um cliente irá ligar e insultá-la de forma injusta, assim como ela tem sido injustiçada ao longo da trama. E claro que isso acontece.

Apesar dessas falhas, “All to Play For” tem o mérito de trazer à tona questões importantes sobre o sistema de assistência social e a luta de uma mãe para reunir sua família. A história desperta uma reflexão sobre as dificuldades enfrentadas por pessoas em situações semelhantes e a necessidade de um sistema mais humano e compassivo. É uma obra cinematográfica que, apesar de suas imperfeições, traz à tona questões sociais pertinentes e toca o espectador com sua representação sincera das lutas e desafios enfrentados por uma mãe determinada a proteger sua família.


Filme: Rien À Perdre (All to Play For)
Elenco: Virginie Efira, Arieh Worthalter, Félix Lefebvre, India Hair, Mathieu Demy, Sandrine Bodenes, Louise Morin, Christophe Briand
Direção: Delphine Deloget
Roteiro: Pierre Chosson, Julia Kowalski, Delphine Deloget
Produção: França
Ano: 2023
Gênero: Drama
Sinopse: Sylvie mora em Brest com seus dois filhos, Sofiane e Jean-Jacques. Juntos, eles formam uma família unida e feliz. Uma noite, Sofiane se machuca quando está sozinho no apartamento, enquanto sua mãe está fora trabalhando. O incidente é relatado e Sofiane é colocado sob cuidado de família substituta. Armada com um advogado, seus irmãos e o amor de seus filhos, Sylvie está confiante de que pode superar as máquinas burocráticas e legais.
Classificação: Não informado
Distribuidor: Ad Vitam
Streaming: Indisponível
Nota: 6,0

Filme exibido no Festival de Cannes de 2023

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