Uma das primeiras coisas que chama a atenção para o filme Clube Zero (2023) de Jessica Hausner, são os comentários sobre este se tratar de um filme polêmico. É claro que muito da construção ao redor da produção dele é embasada nestas pequenas frases retiradas de críticas de grandes veículos da mídia. Quando fui assistir, não busquei muitas informações da obra para além de uma sinopse rasa e, é claro, esses comentários sobre o caráter polêmico do filme.
O que se percebe logo de cara é que Clube Zero se passa em um colégio europeu e, apesar dos nomes diferentes nos créditos iniciais, o idioma escolhido para estes personagens falarem é o inglês. Mia Wasikowska lidera o elenco interpretando a Srta. Novak, uma jovem professora de nutrição que se aproxima de um grupo de alunos que buscam por mudanças drásticas em sua alimentação, sejam essas mudanças por estética, pelo planeta ou mesmo para aumento da média das notas.
Desde o seu início, o filme de Jessica Hausner (Little Joe, 2019) se apresenta de forma bastante peculiar, a trilha sonora é sugestiva e ambienta o espectador em uma atmosfera que quase lembra a de um filme de terror, o que não deixa de ser o caso aqui, uma vez que os acontecimentos abordados vão se tornando cada vez mais esquisitos e até difíceis de segurar o olhar de uma plateia mais sensível.
A paleta de cores, focada nos tons amarelados, esverdeados e azulados, funciona perfeitamente na evolução dos personagens, que tem suas feições, antes coradas como qualquer pessoa minimamente saudável, transformando-se em praticamente cadáveres que andam.
A temática de Clube Zero é ousada ao misturar elementos de coach e de seita em um mesmo filme. Ao longo da obra, enquanto somos apresentados à Srta. Novak, pouco sabemos de sua vida privada, que de fato não é o foco. Tudo o que sabemos é que a jovem mulher tem como missão ajudar esses alunos a se alimentarem de forma consciente, o próprio nome de seu grupo, “Comer Consciente” deixa claro sua tarefa ali.
Apesar da fórmula já bastante batida, o filme de Hausner – escrito a quatro mãos com a parceira Géraldine Bajard – se difere de outras produções que se debruçam sobre transtornos alimentares. Lembrando que aqui não se trata de uma conscientização sobre estes problemas, embarcamos em uma história não muito vivaz, focada em jovens ricos que basicamente estão entediados com a vida em seu colégio de Elite.
Há, é claro, algumas críticas em Clube Zero, revolvendo-se ao redor dos pais destes alunos que entram de cabeça nos ensinamentos de Novak. Lamentavelmente, o que poderia tornar a narrativa mais atraente, é apenas pincelado pela superfície: o relacionamento dos alunos com seus pais que apresentam diversas questões que em grande medida figuram como parte das causas dos problemas destes jovens. Talvez as melhores partes do filme de Hausner sejam aquelas que se ambientam nos lares dos adolescentes, em seus pequenos diálogos com seus genitores que de forma alguma pensam estar prejudicando seus filhos com suas próprias atitudes.
Um dos pontos mais baixos do filme está justamente na escolha de sua protagonista, porém há aqui um certo impasse acerca do trabalho de Mia Wasikowska. Em certos momentos, é como se a atriz fosse perfeita para o papel que representa, e em outros há uma mudança de tom que não agrada tanto. De qualquer modo, acredito que a atriz tenha se doado na mesma medida que o roteiro necessitava.
Falando sobre o roteiro de Clube Zero, há alguns problemas que tornam difícil a tarefa de se manter atento à narrativa apresentada. A medida em que a professora “enfeitiça” seus alunos ao ensinar-lhes que é possível, sim, viver sem ingerir nenhuma comida, somos levados a esperar um determinado desfecho para a obra. Entre momentos de inveja de outros professores pela atenção que Novak recebe de seus alunos e de pais que se mostram abertos a abordagem da professora, somos envolvidos também em um drama desnecessário entre professora e aluno que não acrescenta em nada a narrativa e ainda prejudica o desenvolvimento de um dos personagens adolescentes.
Há, em certos momentos, algumas críticas à sociedade de consumo que, apesar de sutis, são deixadas aqui e ali para o espectador assimilar. O que não fica muito claro, e tudo bem também que fique assim, é o fato de o roteiro de Clube Zero não “escolher” um lado dentro da narrativa que apresenta. Com pouco “carisma”, o filme de Jessica Hausner entedia e em algumas cenas não busca nada além do choque através de encenações escatológicas para causar desconforto no espectador.
O que a diretora e roteirista Jessica Hausner faz em Clube Zero é pegar carona nas “tendências” dos dias atuais. Abordar o universo dos coachs que vendem curas milagrosas para questões impossíveis não foi o erro da cineasta, mas sim apostar em uma “infecção” dessa narrativa coach em cima de adolescentes problemáticos que não geram nenhum sentimento de empatia no espectador.
Falando de modo geral, Clube Zero é um filme sem substância, com mais momentos de tédio do que geradores de grande atenção. Seus destaques ficam por conta de sua trilha sonora e sua direção de fotografia, que juntas estabelecem a sintonia que o elenco e o roteiro juntos não conseguiram durante o longa. Falta originalidade nesse roteiro e a lacuna deixada aqui é bastante sentida durante a narrativa, que se demora demais até ter o seu desfecho. A sensação que fica é que o filme dá voltas ao redor de si mesmo e não vai a lugar nenhum.
Filme: Club Zero Elenco: Mia Wasikowska, Ksenia Devriendt, Luke Barker, Florence Baker, Samuel D. Anderson, Gwen Currant, Sidse Babett Knudsen, Elsa Zylberstein, Mathieu Demy, Amanda Lawrence, Keeley Forsyth, Lukas Turtur. Direção: Jessica Hausner Roteiro: Jessica Hausner, Géraldine Bajard Produção: Áustria, Dinamarca, França Ano: 2023 Gênero: Drama, Suspense Sinopse: Uma professora aceita um emprego em uma escola de elite e forma um forte vínculo com cinco alunos – um relacionamento que acaba tomando um rumo perigoso. Classificação: 18 anos Distribuidor: Pandora Filmes Streaming: Indisponível Nota: 6,5 |