CRÍTICA – AS QUATRO IRMÃS

CRÍTICA – AS QUATRO IRMÃS

Quem acompanha televisão sabe que Vera Holtz é uma das maiores artistas que temos no país. Sua trajetória na teledramaturgia, no cinema e no teatro é esplêndida e recheada de personagens cativantes. Atualmente, Vera brilha na peça “Ficções”, monólogo inspirado no livro Sapiens: Uma breve história da humanidade. Porém, juntamente com esse sucesso dos palcos, a atriz traz um projeto que surge como um respiro dessa Vera Holtz, humanizando-a. Em Quatro Irmãs, ela e suas irmãs Teresa, Rosa e Regina resgatam memórias da infância em Tatuí, no interior de São Paulo, trazendo à tona conflitos das relações familiares e memórias nostálgicas que a fizeram ser a grandiosa artista que é hoje.

Definitivamente, esse documentário ficcional mergulha de cabeça na intimidade dessa família. O ponto de partida se dá com os cem anos do casarão onde viveram, em que suas melhores e piores lembranças estão guardadas. É muito interessante ver um documentário na voz de quatro pessoas. Pessoas essas que são diretamente ligadas e essenciais para o projeto. Elas complementam toda a história. Nitidamente, Vera é o fio condutor da narrativa. O documentário traça linhas que seguem dos sentimentos, anseios e angústias de Vera, que se despe e nos permite adentrar no mais profundo íntimo das suas emoções. E essas recordações são tão intensas, que ela volta até mesmo a menstruar. Vera Holtz voltou a ser Vera Lucia.

Acredito que um grande desafio para o diretor Evaldo Mocarzel tenha sido o fato de que as irmãs de Vera não são atrizes. É nítido o desconforto delas em alguns momentos, talvez até pelo fato de estarem se expondo. Entretanto, a maneira que o diretor encontrou de não constrangê-las é muito delicada. Não é um documentário clássico com depoimentos para a câmera. Na verdade, a câmera está constantemente atrás de portas, por fora de janelas e nós, espectadores, vemos tudo através dessas extremidades. Quase como se estivéssemos espiando o reencontro dessas irmãs com o passado. E nos sentimos acolhidos, mesmo não nos conectando tanto em certos momentos. Acredito que quem viveu a infância ou a adolescência no mesmo período que elas irá se identificar. Logicamente, existem relações e conflitos ali presentes que são inerentes a todas as famílias e à juventude.

Existem cenas roteirizadas também, mas que fazem total sentido para a construção da ideia filme. Em um certo momento, Vera interpreta sua mãe. Em outros momentos, vemos todas auxiliando num monólogo de Vera sobre a família ou até mesmo varrendo a casa sem rumo. Dessa forma, é um documentário que não se propõe a ser realista ao extremo, mas fabula diante desses sentimentos reais. É como se imageticamente nós víssemos o turbilhão de emoções sentidas. Nada parece ser por acaso.

As Quatro Irmãs cumpre seu objetivo. Ele funciona como se você pegasse um diário seu escrito há anos e lesse sem interrupções. Ali tem muito mais do que só memórias, mas  uma construção de seres humanos, de perspectivas. Não é inovador, mas é simples e comove. No sentido da linguagem, acho certeira e tocante. Talvez tenha sido tão íntimo, que nós nos sentimos um tanto quanto deslocados em certos momentos. Para a família e amigos, com certeza deve ser mais que especial. Mas confesso que adoraria ser convidado para esse almoço de família.

Filme: As Quatro Irmãs
Elenco: Vera Holtz, Maria Teresa Holtz Soares, Rosa Cristina Holtz, Regina Holtz
Direção: Evaldo Mocarzel
Roteiro: Evaldo Mocarzel
Produção: Brasil
Ano: 2018
Gênero: Documentário
Sinopse: A atriz Vera Holtz resgata a memória da sua família através do cinema. Em um exercício de autoficção, ela performa a sua mãe, seu pai, de algum modo também suas irmãs e a ela mesma. Relembrando sua infância e adolescência na cidade de Tatuí, no interior de São Paulo, Holtz enfrenta lapsos de memória, refletindo sobre a convivência entre sua família e retratando suas irmãs como suas personas.
Classificação: Livre
Distribuidor: O2 Play
Streaming: Indisponível
Nota: 8,9

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