Não acho necessário ser tão duro em relação às comédias românticas, não acho muito proveitoso olhar para as convenções desse gênero de forma tão crítica, como se o espectador médio desse tipo de filme não tivesse noção dos pactos que ele faz para imergir em histórias que moldam a realidade com um certo grau de fantasia, idealismo ou exagero. Entretanto, se tratando de Casamento em Família (2023) fica difícil não ser enfático aos problemas do filme, não só por ele ser pretensioso mas também por não conseguir fazer o que qualquer outra comédia romântica mediana consegue.
Casamento em Família, originalmente titulado Maybe I do (nome bem menos genérico), é o longa de estreia do diretor Michael Jacobs, que traz um elenco de peso e conta a história de três relacionamentos em crise e interligados. Howard (Richard Gere) está traindo sua esposa Grace (Diane Keaton) à alguns meses com Monica (Susan Sarandon), mas essa relação extraconjugal, por sua vez, também está se desgastando e caminhando para um fim. Paralelamente, em uma das noites que Howard está ausente, Grace decide ir ao cinema, onde conhece Sam (Willian H. Macy) e os dois têm uma noite romântica com longas conversas andando pela cidade. Por último, Michelle (Emma Roberts), que é filha de Howard e Grace, enfrenta uma crise no namoro com Allen (Luke Bracey), filho de Monica e Sam, após ele ter pulado na frente dela para impedir que ela pegasse o buquê no casamento de uma amiga. A partir daí, eles começam a discutir seu futuro, pensando se vão levar ou não o seu relacionamento para um próximo passo, o casamento.
Dessa forma, o filme se inicia com uma trama instigante e uma premissa aparentemente boa, conforme ele sugere ser uma reflexão divertida sobre a instituição do casamento, nesse impasse de troca de traições e incertezas sobre a vontade de se casar. Cria-se assim uma expectativa que não é cumprida, graças ao roteiro. Primeiro pelo fato de não ser muito engraçado, mesmo tendo contextos que tornam o filme divertido, são poucos os momentos em que tive uma risada genuína, que provavelmente foram sustentados pelo carisma das ótimas atuações do elenco mais experiente. Talvez Casamento em Família funcione melhor para uma faixa etária diferente da minha, mas com certeza seu humor tem um ar antiquado, seja no olhar sobre a velhice, seja na moral cristã ou na visão sobre o matrimônio em si.
Isso nos leva ao segundo aspecto do roteiro, ele é uma adaptação de uma peça da Broadway de 1978, que não é muito conhecida, justamente pelo fato de não ter conseguido ficar nem um mês em cartaz. Tal fato explica alguns aspectos, como elementos narrativos que parecem estar fora de lugar e época, algo que talvez uma adaptação mais livre e menos conservadora pudesse ter contornado. Além das reflexões sobre casamento presentes no filme, que parecem não ter sido tão bem atualizadas.
Nesse sentido, em diversos momentos ocorrem diálogos sobre a validade do casamento, se ele realmente funciona, se vale a pena o risco ou não, sendo em boa parte falas rasas, com analogias superficiais e frases de efeito. Sendo assim, essas pseudo reflexões percorrem o filme, desde o início dos embates entre Michelle e Allen, passando pelas cenas de aconselhamento com suas respectivas famílias, até chegar o tão esperado momento, clímax do filme, em que as duas famílias que não sabiam que seus amantes eram sogros de seus filhos, se encontram para um jantar em que o casal irá decidir se vai ou não se casar.
Não espero que uma comédia romântica traga uma análise profunda da instituição do casamento monogâmico, da família mononuclear ou algo do tipo, mas o filme cria uma expectativa enganadora no seu desenvolvimento, fazendo crer que ele pelo menos terá uma visão não idealizada ou romantizada do casamento e é algo que ele realmente apresenta, mas ao seu final desmancha ela de forma brusca, esperando que com uma trilha emocional clichê e com um uso deslavado de imagens de arquivo do Central Park na mudança de estações, o espectador irá aceitar o desfecho desonesto.
Talvez o final não fosse tão sem nexo se o diretor e roteirista Michael Jacobs estivesse preocupado em desenvolver mais seus personagens e não só seus dilemas específicos naquelas situações, esse é o terceiro ponto negativo do roteiro, invés de investir tempo em momentos românticos, ele investe em conflito e reflexões rasas que nem condizem com o final do filme. O único casal em que se vê uma química, criada justamente por terem mais momentos fofos, desajeitados e engraçados do que discussões, não têm um desfecho bom. Assim, Casamento em Família quer empurrar goela abaixo um final que ele não criou bases narrativas para que existisse e forçar um discurso sobre casamento que não condiz com o que foi apresentado ao decorrer do filme. Essa comédia romântica falha duplamente, no humor e no romance, ofuscados por uma reflexão pretensiosa que se prova vazia ao final do filme.
Filme: Maybe I Do (Casamento em Família) Elenco: Diane Keaton, Richard Gere, Susan Sarandon, Emma Roberts, Luke Bracey e Willian H. Macy Diretor: Michael Jacobs Roteiro: Michael Jacobs Produção: EUA Ano: 2023 Gênero: Comédia Romântica Sinopse: No coração de Nova Iorque, o romance de Michelle e Allen chegou ao ponto em que é altura de os pais se conhecerem finalmente. Mas, uma vez cara a cara, o jantar fica rapidamente descontrolado, quando os pais percebem que cada cônjuge dorme com o outro. Ao tentarem esconder dos filhos os seus casos extraconjugais, as suas artimanhas transformam a noite num caos cómico. Classificação: 12 anos Distribuição: Paris Filmes Streaming: Indisponível Nota: 4,5 *Estreia dia 23 de fevereiro de 2023 nos cinemas* |