CRÍTICA – MADAME TEIA

CRÍTICA – MADAME TEIA

A Sony foi a grande responsável por pavimentar o cenário do cinema de heróis ao mostrar que estes filmes podem ser extremamente lucrativos. Além disso, o estúdio também apresentou produções da mais alta qualidade do gênero de ação e fantasia com Homem-Aranha 2, que mudou a rota do cinema para sempre tendo em vista que a trilogia de Sam Raimi (principalmente o segundo) servem como molde narrativo para grande parte dos filmes do Universo Cinematográfico Marvel. Hoje, depois do sucesso multimilionário da Saga do Infinito do UCM, a Casa das Idéias trouxe de volta para sua alçada grande parte dos seus heróis que estavam espalhados entre estúdios depois do leilão de personagens na década de 90; como Blade, Quarteto Fantástico, X-Men, Hulk, Demolidor e entre outros. O único que continua fora de casa é o extremamente lucrativo Universo do Homem-Aranha que hoje é desenvolvido nos cinemas através de seus vilões no confuso Sonyverso no qual Madame Teia, o primeiro de três filmes que ainda serão lançados este ano.

No entanto, este universo do Homem-Aranha sem o Homem-Aranha nunca conseguiu de fato agradar o público geral e fazer sucesso de bilheteria, com exceção de Venom, que infelizmente catapultou essas histórias. Mas veja bem, as produções estreladas por Tom Hardy na pele de Eddie Brock estão longe de serem desinteressantes. Na minha concepção, tanto o primeiro quanto o segundo filme são incríveis exemplares do “tão ruim que é bom”. A comédia surtada protagonizada por Hardy possui momentos icônicos, atores se divertindo em cena, boas ideias, roteiros medianos e carisma de sobra para se tornar um querido; coisa que Morbius teria conseguido se tivesse boas ideias (a cena viral de Matt Smith não me deixa mentir).

Madame Teia por outro lado, falha até mesmo em ser um filme ruim de respeito, por levar a sua trama absurda, desconexa e completamente sem noção com muita seriedade e não abraçar de vez a galhofa construída.

Na história, acompanhamos Cassandra Webb (Dakota Johnson), uma paramédica de Nova York que após uma experiência de quase morte desperta um poder oculto: enxergar visões que premonizam um futuro próximo (tendo muitas sensações de déja vu). Ezekiel Sims (Tahar Rahim) também compartilha dos mesmos poderes, com a diferença de que toda noite ele tem sonhos vívidos em que luta com três heroínas vestindo “mantos de Aranha”. Obcecado com o seu futuro trágico, Sims começa uma caçada para eliminar as meninas antes que elas se tornem as heroínas que o matam.

Em meio a grande Nova York, todas as peças se cruzam no metrô e Cassie começa a ter diversas visões de Sims matando as meninas — interpretadas por Sydney Sweeney, Isabela Merced e Celeste O’Connor. Toda trama se desenrola a partir do momento em que ela as salva e as suas vidas começam a depender uma da outra. Por conta deste encontro, Cassie também começa a conhecer mais sobre si mesma e o seu passado.

Com apenas 6 personagens atuando diretamente na trama, a equipe de roteiristas (5 no total) falha em desenvolvê-los para além dos arquétipos. Até existe uma tentativa de mergulho nos dramas pessoais de cada uma das mulheres, mas tudo fica na superfície e se resolve no contexto familiar — ou melhor, na ausência dele. Como se existisse uma conexão “do além” que une os solitários. Gosto destas questões que envolvem o poder das coincidências, mas é impressionante a forma rasa e expositiva que o longa trabalha essa aproximação. 

Aproximação esta que é simplesmente o ponto principal de todo o filme, principalmente quando observamos a escolha do embate entre personagens humanos e sem poderes (as “everywoman”) contra um vilão que compartilha dos mesmos poderes que o Homem-Aranha que conhecemos. 

Do lado do vilão, a situação fica ainda mais piegas, por toda construção maniqueísta de personagem (só faltava ele esfregar mãos ao descrever o seu plano) e no seu visual com os cabelos lotados de gel e na escolha completamente sem sentido de colocá-lo na perseguição sem sapato (sim, ele anda de terno e descalço; como se não fosse chamar mais atenção). Não existe nenhum momento em que Sims representa alguma ameaça e tampouco medo já que ele é dono de uma inteligência convenientemente limitada.

Porém, seria injusto da minha parte falar que Madame Teia não possui boas ideias. A diretora S.J. Clarkson tem algumas escolhas criativas que mostram que o filme tinha ao menos um potencial estético e temático mais interessante do que foi mostrado. Tanto que os melhores momentos se dão quando Clarkson explora essa espécie de ensaio-montagem através das elipses temporais e cria, desta forma, momentos cômicos e absurdos para o desenrolar de algumas situações. Fica nítido uma tentativa de emular Tudo em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo, mas muito longe dos méritos de Paul Rodgers

Outro ponto foi justamente essa humanização das personagens. A escolha corajosa de colocá-las para ganharem poderes e de vestirem os mantos clássicos apenas numa visão futura de poucos segundos quebra a expectativa do que se espera de filmes de heróis, principalmente em relação ao famoso “terceiro ato explosivo, com poderes e porradaria”, gerando aquela curiosidade e expectativa de como tudo vai se desdobrar (infelizmente da forma menos criativa). Escolhas que vão na contramão do que a Marvel tem feito nos cinemas e televisão: distribuir poderes e “super trajes” até para os seus personagens mais terrenos.

Contudo, o principal problema do Sonyverso é muito mais sintomático do que individualizado. Não são apenas histórias meia boca, é uma somatória que envolve falta de conhecimento, carinho, profundidade e, acima de tudo, confiança para com os seus personagens. É como se eles existissem apenas por existir, sem qualquer substância material para além da alcunha de “vilão do Homem-Aranha” num universo no qual ele não existe. Tanto que os demais filmes tentam copiosamente e forçadamente trazer alguma conexão com o herói, seja imagético, textual ou dentro da própria trama. Como a conexão de Venom 2 com Sem Volta Para Casa, a aparição de Michael Keaton e os jornais com a imagem do teioso em Morbius ou a proximidade de Cassie e os pais de Peter Parker (Ben e Mary, grávida de Peter no filme).

É como se estes personagens não conseguissem ser protagonistas de suas próprias histórias, num universo montado para eles. Então no final de tudo sempre sobra um vácuo ou uma peça faltando para que essas histórias funcionem.


Madame Teia - poster Filme: Madame Web (Madame Teia)
Elenco: Dakota Johnson, Sydney Sweeney, Isabela Merced, Celeste O’Connor, Tahar Rahim, Adam Scott, Emma Roberts, Kerry Bishé, Zosia Mamet e Mike Epps
Direção: S.J. Clarkson
Roteiro: S.J. Clarkson, Matt Sazama, Burk Sharpless, Kerem Sanga e Claire Parker
Produção: Estados Unidos
Ano: 2024
Gênero: Ação, Fantasia
Sinopse: Depois de sobreviver a um terrível acidente, a paramédica Cassandra Webb começa a desenvolver habilidades de clarividência. Forçada a enfrentar revelações sobre seu passado, ela estabelece um relacionamento com três jovens destinadas a futuros poderosos… se todas conseguirem sobreviver a um presente mortal.
Classificação: 14 anos
Distribuidor: Sony Pictures
Streaming: Indisponível.
Nota: 0,5

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