CRÍTICA – OPPENHEIMER

CRÍTICA – OPPENHEIMER

Oppenheimer (2023) é um belo exemplo de uma das características mais cativantes do cinema em geral, que é o fato de os filmes conseguirem transformar histórias que normalmente não nos interessaríamos em algo atrativo e nos entregar, muitas vezes, experiências incríveis ao assisti-los. Particularmente falando, a história do pai da bomba atômica não é necessariamente a mais atraente para mim, porém, a criação de Christopher Nolan (Interstellar, 2013; Dunkirk, 2017) se mostrou uma experiência cinematográfica completa.

Baseado no livro vencedor do Pulitzer Oppenheimer: A triunfo e a tragédia do Prometeu americano de Kai Bird e Martin J. Sherwin, o filme traz Cillian Murphy (Inception, 2010; Peaky Blinders, 2013-2022) no papel principal. Parceiro recorrente de Christopher Nolan, essa é a primeira vez em que o ator estrela como protagonista em uma das obras do diretor e roteirista.

Logo no início de sua exibição, Oppenheimer lança uma citação que diz algo sobre Prometeu roubar o fogo dos deuses para dá-lo aos homens, e que sua atitude o levou a ser acorrentado e torturado pela eternidade. Essa citação permanece conosco durante todo o filme e é, basicamente, uma espécie de profecia para o futuro do protagonista.

É válido dizer que Oppenheimer não é uma obra que busca redenção para o seu protagonista. O personagem de Cillian Murphy não é retratado, em nenhum momento, como um herói ou algo parecido. A narrativa do filme é centrada em muitos anos da vida do físico e o acompanha desde seus anos na faculdade, onde estudava quase que compulsivamente. O retrato perfeito de um gênio atormentado pelo conhecimento acumulado, onde questões éticas e morais não tem muito espaço.

Algo que fica bastante evidente nesta obra é a qualidade do elenco escolhido por Christopher Nolan. Cillian Murphy é, sem sombra de dúvidas, um dos melhores atores que há na atualidade e entrega aqui o melhor trabalho de sua carreira. As transições entre a genialidade e completa perturbação que acompanham Oppie incessantemente são magistralmente conduzidas pelo ator, que ao ser esquadrinhado pela câmera rente à sua face durante a maior parte do filme, se desnuda por completo ao espectador. Para além de Murphy, o vasto elenco de Oppenheimer ainda conta com Emily Blunt, Florence Pugh, Matt Damon, Robert Downey Jr., Josh Hartnett, Benny Safdie, Dane Dehaan, Rami Malek, Casey Affleck, Jason Clarke, Kenneth Branagh, Gary Oldman e muitos outros.

Dentro desta predominância de homens, Emily Blunt (Sicario, 2015; A Quiet Place, 2018) e Florence Pugh (Little Women, 2019; Midsommar, 2019) destacam-se, ainda que suas personagens não sejam das mais bem construídas do filme. Principalmente Blunt que entrega cenas marcantes como Kitty, esposa de Oppie. Embora seu trabalho aqui seja na maior parte do tempo um complemento à figura de seu marido, sua personagem tem algumas das melhores linhas do filme, como “você não pode pecar e esperar que tenham pena de você quando houver consequências.”

A narrativa não linear do filme, que transita entre tomadas coloridas e em preto e branco, nos conta quase que duas histórias, ao mostrar a rivalidade entre J. Robert Oppenheimer e Lewis Strauss (Robert Downey Jr.). De todos os indivíduos que odeiam o protagonista, Strauss é o que se destaca nesse duelo de grandes homens. A construção e evolução desse personagem são muito bem desenvolvidas e mesmo o limitado Robert Downey Jr. entrega uma atuação convincente que em nada nos faz lembrar de filmes de super-heróis.

O aspecto extremamente teórico da física é uma característica que está presente em grande parte das obras de Nolan e aqui não é diferente. Em muitos momentos entender o que os personagens estão conversando é tarefa difícil e, apesar disso, as imagens falam por si só e o deleite visual encobre a falta de conhecimento de uma parte da audiência em conceitos da Física. O trabalho de efeitos visuais e sonoros é encantador e instiga no espectador a angústia, bem como a ansiedade e inquietação de seu personagem principal. A trilha sonora, inflada da mais alta música clássica expõe a intelectualidade dos círculos de gênios.

O maior conflito ao assistir Oppenheimer, para mim, foi com a temática da obra em si. Para quem é importante saber sobre quem criou uma arma extremamente perigosa para o mundo? Há o fato dessa figura histórica ter sido um gênio, porém, citando o personagem de Matt Damon, “genialidade é algo esperado de um físico.” E ao expor essa opinião, não diminuo a produção em si, pois acredito se tratar de um grande filme. Questiono somente a importância que se dá a certos temas em detrimento de outros.

Pouco se fala sobre as vítimas da grande criação de J. Robert Oppenheimer e acredito que há certa “polêmica” em trazer para a tela a história do criador de um dispositivo que de nada serviu à humanidade além de destruir as vidas e o futuro da população de duas grandes cidades do Japão – Hiroshima e Nagasaki – ao fim da Segunda Guerra Mundial.

A todo momento o filme nos lembra, a partir do protagonista, que seu trabalho ali não é destruir nada, mas criar o que lhe foi solicitado pelo governo americano. O que lembra, em contexto parecido, de Adolf Eichmann, oficial nazista que ao ser julgado por sua importante participação na Guerra, alegou inocência por estar ali somente “fazendo o seu trabalho”. Limpar as mãos após o estrago feito, para mim, não é característica de homens que valham a pena a lembrança.

Como obra cinematográfica, Oppenheimer é um filme espetacular, em toda a significação da palavra. Como menciono no início desse texto, a experiência é completa. Minha ressalva está no tema escolhido para abordagem. Christopher Nolan é um cineasta muito amado e odiado pelo público e acredito que use isso a seu favor. Falando bem ou mal, estamos todos assistindo e comentando seu filme, que vale, sim, todo o tempo investido para apreciação.


  Filme: Oppenheimer
Elenco: Cillian Murphy, Emily Blunt, Matt Damon, Florence Pugh, Robert Downey Jr., Josh Hartnett, Dane Dehaan, Casey Affleck, Rami Malek, Gary Oldman, Jason Clarke.
Direção: Christopher Nolan
Roteiro: Christopher Nolan
Produção: Estados Unidos, Reino Unido
Ano: 2023
Gênero: Biografia, Drama
Sinopse: O físico J. Robert Oppenheimer trabalha com uma equipe de cientistas durante o Projeto Manhattan, levando ao desenvolvimento da bomba atômica.
Classificação: 16 anos
Distribuidor: Universal Pictures Brasil
Streaming: Indisponível
Nota: 9,0

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