CRÍTICA – TED LASSO (3ª Temporada)

CRÍTICA – TED LASSO (3ª Temporada)

Ted Lasso não precisou de mais do que meia temporada para se tornar uma das séries mais divertidas e gostosas de assistir na atualidade. A produção conquistou o coração do público pelo seu protagonista e personagens igualmente carismáticos e por ter entendido que seria impossível falar sobre futebol sem uma boa dose de drama. O primeiro ano, por sinal, pegou muita gente desprevenida com episódios emocionantes e arcos narrativos para lá de dramáticos. A segunda temporada explorou ainda mais os dramas de seus personagens, vide o premiado episódio No Weddings and a Funeral e outros mais descentralizados da trama principal como Beard After Hours.

Um fato interessante é que ao analisarmos a estrutura do roteiro de Ted Lasso, vemos que ele funciona quase como um jogo de futebol: é o que está no centro de campo que define o ritmo e como os personagens vão se movimentar a partir do momento que a bola começar a rolar. Ou seja, a produção sempre se destacou por possuir temáticas centrais muito bem acentuadas. Na sua temporada de estréia os temas eram pertencimento e família; já na seguinte, os roteiristas foram sagazes ao abordar a saúde mental no esporte e na vida (um tema que esteve bastante em alta por conta das Olímpiadas) – sobre estar bem consigo mesmo. E ainda que tivessem arcos mais independentes atuando aqui e ali, o texto nunca perdia a posse do seu tema. 

A terceira temporada, no entanto, carece de um tema central que não seja a incerteza de se esta seria ou não a última da série – e, sim, é. Desta forma, o fim deste primeiro capítulo da saga de Richmond na Premier League precisa resolver, desconstruir e reconstruir muitos arcos, consertar erros, explorar personagens e discutir temas caros do mundo da bola; não sobrando muito tempo para olhar o centro de campo e focar na partida como um todo. Isso é bom, pois dá mais liberdade aos criadores e possibilita diversificar melhor o texto. Porém, a falta de clareza atrelada a muita liberdade dá espaços para claros erros de desenvolvimento.

A irregularidade que tanto afetou o time de Richmond, começa também a afetar a narrativa da série. A terceira temporada estabeleceu que todos os seus episódios teriam em torno de 50 minutos a um pouco mais de 1h. A decisão não é despropositada, em alguns episódios como Sunflowers eu gostaria que demorasse outra 1h de tão divertido, singelo e narrativamente impecável ele foi. Aqui vemos os seus personagens interagindo uns com os outros fora das quatro linhas explorando da melhor forma possível essa variedade de temas. Roy Kent (Brett Goldstein) e Jamie Tartt (Phil Dunster) trocam carismas e recompensam a audiência que a tempos gostaria de ver uma interação mais calorosa entre os dois e Trent Crimm (James Lance), que agora está escrevendo um livro sobre o time, tem uma conversa linda com Colin (Billy Harris), o único futebolista gay do time. Neste último vemos a delicadeza dos roteiristas de tratar uma temática tabu no futebol: a homossexualidade. Por outro lado, em episódios como We’ll Never Have Paris eu só gostaria que tivesse 30 minutos focados na relação de Ted com seu filho, no mais é completamente esquecível.

A propósito, é exatamente neste episódio em que observamos um dos maiores problemas da terceira temporada: o arco da Keeley (Juno Temple). Ela é uma das personagens mais queridas e carismáticas do elenco e não é por mais, Temple fez um ótimo trabalho com ela. Nas temporadas anteriores ela protagonizou um dos núcleos mais divertidos de se acompanhar ao lado de Roy e sua sobrinha. Depois do casal ter se desfeito, os roteiristas não souberam como continuar a sua história de independência, tanto que os momentos focados na sua agência de PR pareciam um spin-off dentro de Ted Lasso. Isso fica ainda mais claro quando os roteiristas reconhecem os seus erros no meio da temporada e colocam a personagem de volta de onde ela não deveria ter saído: ao lado de Richmond e companhia.

Outro arco bastante independente neste ano foi o de Nate (Nick Mohammed), antigo auxiliar técnico de Ted, que virou a casaca e se tornou treinador do West Ham, time o qual o ex-marido da Rebecca é o dono. O seu desenvolvimento aqui é óbvio, por assumir o posto de antagonista com um arco de redenção bastante claro, mas nunca desinteressante. Toda a sua caracterização ajudou muito nessa construção. Os seus cabelos brancos estão longe de serem apenas uma alusão ao José Mourinho, mas também representa a sua perda de identidade após o season finale. Agora, ele precisa voltar às suas origens para se reencontrar neste “novo Nate”.

Como dito anteriormente, com a duração aumentada dos episódios, pudemos conhecer mais daqueles que formam o time, com destaque para McAdoo (Kola Bokkini). O capitão nunca teve muito tempo de tela e era mais uma figura coadjuvante e arquetípica de líder, o que não correspondia com a sua importância em Richmond. Agora, ele pôde se mostrar mais ao lado de Sam (Toheeb Jimoh) e Dani Rojas (Cristo Gonzalez), os principais jogadores do time ao lado de Tartt. É válido ressaltar o trabalho impecável de direção de elenco. Todos do time tem seus momentos de brilho e entregam atuações incríveis, mas o nome dessa temporada (da série e da Premier League) é de Jamie Tartt. Ele talvez seja o personagem que apresentou a melhor evolução de um ano para o outro, e isso se deu pelo ótimo trabalho de Dunster. O ator rouba a cena e tem uma das melhores atuações deste último ano. Por falar em atuação, nunca é demais elogiar a tríade – Jason Sudeikis, Hannah Waddingham e Brett Goldstein. Sudeikis é um gênio, Waddingham uma força da natureza e Goldstein está cada vez mais carismático

Mesmo que sem um tema central e focando individualmente em seus personagens, Ted Lasso segue discutindo assuntos cruciais do mundo do futebol e mostra que captou a essência do esporte como poucos. Próximo do fim da temporada, em International Break, os presidentes dos times se reúnem com o bilionário Akufo (Sam Richardson) para conversar a respeito da criação de uma Super Liga (uma clara referência a Super Liga Europeia). Os realizadores deixam muito claro o seu ponto de vista: uma atitude execrável dos grandes executivos do esporte. Eles teriam me ganhado de imediato apenas se tivessem trazido a problemática a partir da ironia, mas eles vão além e no final do episódio somos presenteados com um monólogo maravilhoso sobre o esporte através de Waddingham, que nos leva dramaticamente por essa e outras cenas de Ted Lasso.

Entre altos e alguns baixos que definiram o time de Richmond até aqui, vale destacar que, mesmo no pior momento da temporada – quando estavam várias partidas sem vitória, jogando mal e ocupando o posto de lanterna da Premier League –, nunca faltou coração para essa história e o series finale é a prova viva. Se os roteiristas erraram no desenvolvimento de alguns personagens, eles entenderam e conseguiram consertar os seus erros para dar o desfecho que eles precisavam. O que era de se esperar, tendo em vista que a produção sempre soube recompensar o investimento emocional de seu público. Dito isso, se despedir de Ted Lasso não é fácil. Não foi para Rebecca, não foi para mim e tampouco será para quem se apaixonou pelo pior melhor técnico de futebol da história.


Ted Lasso - Rotten Tomatoes Série: Ted Lasso (3ª Temporada)
Elenco: Jason Sudeikis, Hannah Waddingham, Brett Goldstein, Juno Temple, Nick Mohammed, Brendan Hunt, Cristo Gonzalez, Kola Bokkini, Toheeb Jimoh e Jeremy Swift
Showrunners: Jason Sudeikis, Bill Lawrence, Brendan Hunt e Joe Kelly
Produção: Estados Unidos | Reino Unido
Ano: 2023
Gênero: Comédia
Sinopse: Os Greyhounds estão de volta para a terceira temporada de Ted Lasso. O AFC Richmond retorna para a Premier League porém a imprensa esportiva caçoa colocando o time como o pior do campeonato. Além da pressão da mídia, a equipe sofre com o desfalque de Nate, que foi para o West Ham. Ted, por sua vez, tenta lidar com seus dilemas profissionais e pessoais.
Classificação: 12 anos
Distribuidor: Apple
Streaming: Apple TV+
Nota: 8,5

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