CRÍTICA – TRIÂNGULO DA TRISTEZA

CRÍTICA – TRIÂNGULO DA TRISTEZA

Em tempos de The White Lotus ou Succession, que entregam fortes críticas à alta sociedade e suas hipocrisias, Triângulo da Tristeza poderia soar um tanto batido. O filme de Ruben Östlund, dividido em 3 partes, por se tratar de um tema não tão novo e que já está sendo debatido de maneira excelente em diversas produções audiovisuais, traz consigo a responsabilidade de discuti-lo de forma inovadora. À primeira vista, a maneira que a narrativa é conduzida é instigante e provocativa, mas, a partir da segunda parte, parece que acompanhamos pequenas esquetes de um humor escrachado que parecem um tanto quanto repetitivas.

Inicialmente, o primeiro capítulo aborda um casal de modelos lindos em ascensão numa discussão sobre quem irá pagar a conta de um restaurante. Essa briga, que poderia ser algo cotidiano, traduz muito bem certas relações de gênero sem cair na superficialidade, construindo muito bem esses personagens de uma maneira sutil, mas certeira. São egocêntricos e de uma futilidade sem tamanho que nos faz revirar os olhos, mas que, de alguma maneira, entendemos a perspectiva de cada um. A partir do segundo capítulo, quando esse casal vai para uma luxuosa viagem de iate, passamos a observar os passageiros e suas relações com a tripulação, mesmo que os supermodelos continuem sendo o fio condutor da narrativa. É nesse momento que as coisas começam a desandar.

Se no começo tínhamos diálogos mais interessantes e bem escritos, na segunda parte vemos inúmeros clichês desse tipo de enredo: a elite econômica explorando e ridicularizando empregados como forma de manutenção do poder. Não posso deixar de dizer que certos personagens e cenas são realmente engraçados, principalmente quando fogem da caricatice, mas, em certo ponto, os diálogos tornam-se redundantes. O personagem de Woody Harrelson, por exemplo, é notável, mas deixado de lado para servir de escada para personagens de uma nota só, sem tanta tridimensionalidade. 

Uma parte certamente marcante do segundo capítulo é a exagerada escatologia. Sim, é um filme que retrata a podridão das elites. Literalmente. A partir de movimentos de câmera que refletem o balanço do barco e de diálogos mais repulsivos, no sentido nojento da palavra, o filme traz a sensação de enjoo, que se eleva posteriormente. Com isso, inicia-se uma sequência massante e desnecessariamente longa de náuseas e excrementos em tela. Não que essas cenas sejam descartáveis para a narrativa criada por Östlund, mas poderia ter menos tempo de duração.

Na terceira parte, organiza-se uma lógica de inversão de papéis sociais. Diante de um acontecimento importante, o filme trabalha uma maneira de explorar a interação de indivíduos diferentes que estão passando por um conflito em comum, o que já era de se esperar ao pensarmos sobre o que a obra se trata. Entretanto, toda a explicitude que se construiu ao longo das horas cai por terra ao tratarem de novas situações entre os personagens, que exploram relações improváveis sem necessariamente saírem do lugar. O casal de modelos é bem aproveitado e consegue adquirir novas camadas, mas quem realmente rouba a cena é a atriz Dolly De Leon, que interpreta magistralmente Abigail, faxineira do iate que toma o poder da situação em questão. É bem corajoso o fato de apresentarem a melhor personagem somente na terceira parte. 

Triângulo da Tristeza é pretensioso e traz questões importantes. Tenta ser provocativo, mas somente até a página dois, com o desejo de ser inovador e questionador, mas sem realmente realizar isso.  Através da sátira repetitiva e já abordada tantas vezes, a obra parte para uma brutalidade excessiva. Há uma mudança de dinâmica narrativa entre os capítulos que acaba freando o ritmo do filme e deixando ele mais exaustivo do que deveria. Facilmente poderia ter pelo menos uns 20 minutos a menos para que ficasse mais coeso e enfático. Sem uma trama tão bem elaborada, as atuações e algumas cenas mais pontuais são os pontos mais fortes do filme. O fato do desfecho ser inconclusivo traz um dilema moral interessante, mesmo que já tenha visto isso algumas outras vezes. Acredito que o que faltou para que o filme pudesse ser mais próspero, foi o equilíbrio entre o humor e a barbárie e, principalmente, uma concordância no desenvolvimento entre os capítulos.

Filme: Triângulo da Tristeza
Elenco: Harris Dickinson, Charlbi Dean Kriek, Woody Harrelson, Thobias Thorwid, Jiannis Moustos
Direção: Ruben Östlund
Roteiro: Ruben Östlund
Produção: Suécia, Alemanha, França, Dinamarca
Ano: 2022
Gênero: Drama, comédia
Sinopse: Triângulo da Tristeza é o filme vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes 2022. A história começa acompanhando os jovens modelos Carl e Yaya, que estão navegando pelo mundo fashionista enquanto tentam se tornar influencers. Eles ganham passagens para viajar num cruzeiro de luxo, sendo os únicos passageiros classe média num grupo de milionários, liderado por um alcóolatra capitão comunista do barco. Porém, uma noite de tormenta e ataques de piratas fazem o navio naufragar, deixando os sobreviventes presos numa ilha deserta. A hierarquia dentre o grupo muda completamente quando dentre esse bando de ricaços, a única pessoa que sabe como sobreviver nesse local inóspito é a faxineira filipina – capaz de pescar e fazer uma fogueira. Logo, essa sarcástica comédia dirigida e escrita por Ruben Östlund passa a discutir tal nova dinâmica que inverte os poderes entre os sobreviventes e passa a questionar os papéis de gênero.
Classificação: 16 anos
Distribuidor: Diamond Films
Streaming: Indisponível
Nota: 7,2

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