CRÍTICA – UM SAMURAI EM SÃO PAULO

CRÍTICA – UM SAMURAI EM SÃO PAULO

A história contada pelas vidas vividas

“Um Samurai em São Paulo” conta a história de Taketo Okuda, mestre de karatê japonês que veio ao Brasil em missão da Associação Japonesa de Karatê. Okuda foi pupilo de um dos pupilos de Gichin Funakoshi, responsável pela disseminação do estilo shotokan de karatê pelo mundo. Aqui vale uma curiosidade: Van Damme e Chuck Norris aprenderam esse estilo.

Quando Funakoshi e o mestre de Okuda morreram, ele retomou os preceitos mais milenares do karatê, trazendo de volta o conceito samurai do Bushido e se afastando do karatê competitivo. Ignorando, por um momento, as atrocidades históricas cometidas derivadas do código de honra dos samurais, hoje em dia tão romantizados, o bushido era o caminho do guerreiro, que incluía conceitos como justiça, coragem, honra, lealdade, sinceridade, educação e benevolência.

Okuda viveu os horrores da Segunda Guerra Mundial e eventualmente saiu de seu país para construir uma nova vida. Em paralelo à história de Okuda, a cineasata Débora Mamber Czeresnia conta um pouco sobre a vida da sua família na fuga do Holocausto sob a Alemanha Nazista.

A história contada pelo tempo

O que achei muito positivo no documentário foi focar na história da globalização do karatê shotokan por meio da figura do mestre Taketo Okuda. O “Samurai de Pinheiros” é uma figura complexa e o documentário faz um ótimo trabalho em desenrolar os nós dessa expansão do karatê a partir da perspectiva pessoal do mestre Okuda. Mesmo contando coisas por vezes temerárias, o documentário mantém sempre o ar de paz e controle que é possível perceber no mestre Okuda.

No entanto, senti falta de um pouco mais sobre a figura de Funakoshi, e depois também do mestre de Okuda, Masatoshi Nakayama. Eu pratiquei Karatê por dois anos (o que não é nada para a prática), e me causou uma estranheza ver a história apresentada como se esses dois fossem os únicos falando de karatê na época. Funakoshi é, claro, o grande nome do karatê shotokan moderno, mas me causou essa estranheza, como se essa vertente existisse em um vácuo, salvo o bushido.

A história paralela

Por mais que eu entenda o paralelo das histórias da família da cineasta com a história do mestre Okuda, e acho que entenda o que Czeresnia quis argumentar com isso, para mim infelizmente foi algo que não se sustentou. A inserção da cineasta na história pouco agregou ao documentário, e acabou superficial. Ouvimos um pouco sobre a jornada dela no dojo, mas sem grande complexidade (ele foi meu professor, ele era gentil, ele não falava comigo, etc). Ouvimos um pouco sobre a jornada de sua família para fugir do Holocausto, mas parece que, para um paralelo tão carregado como esse, ela quis resolver isso nos últimos 5-8 minutos finais do documentário.

A ideia é boa, tem muito aí a ser explorado, até por serem dois países do Eixo. Mas, como alguém que claramente se aprofunda muito em questões de guerra (vide minhas críticas de “Nada de novo no Front” e “A Conferência“, por exemplo), não me trouxe nada novo, e acabou mais como um “quero homenagear minha família” do que “isso realmente tem um lugar aqui”. E tudo bem, é honorável querer trazer essa memória à tona, mas me faltou complexidade na hora de entrosar as duas histórias.

 A produção

Dito isso, o documentário é filmado com muita sensibilidade e muito carinho pela arte do karatê. As imagens iniciais da armadura de samurai são lindas, assim como as imagens finais de Okuda. O filme se torna quase que automaticamente interessante pela clara paixão da cineasta para com o tópico. A admiração e respeito de Czeresnia são palpáveis, e isso é muito carateca da parte dela. É um claro projeto de amor, uma forma de eternizar uma figura tão importante das artes marciais em São Paulo assim como foi o mestre Taketo Okuda.

“Um Samurai em São Paulo” é obrigatório para todos os participantes de artes marciais, na minha opinião. Sobre o Holocausto, é também sempre importante lembrar, seja como for, do que aconteceu para evitar que aconteçam de novo em outros lugares.

Um Samurai em São Paulo Filme: Um Samurai em São Paulo
Elenco: Taketo Okuda
Direção: Débora Mamber Czeresnia
Roteiro: Débora Mamber Czeresnia, Daniela Capelato
Produção: Brasil
Ano: 2022
Gênero: Documentário
Sinopse: “Um Samurai em São Paulo” conta um pouco da história do mestre Taketo Okuda. Mestre do karatê enviado à São Paulo na década de 70, ajudou a difundir o karatê shotokan no Brasil.
Classificação: 10 anos
Streaming: Indisponível
Nota: 7,5

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