Como eu já disse em uma crítica anterior, a A24 não brinca em serviço. Essa produtora sabe produzir filmes como ninguém. X é um desses que, sem hesitar, podemos chamar de novo clássico do gênero do horror. Aparentemente simples, mas certeiro. Ele demonstra não só a capacidade do estúdio de desenvolver uma obra provocativa, mas sem ser pretensiosa ou cínica, mas a excelência do trabalho do diretor Ti West. Pearl, que conta a origem da vilã de X, consegue aprofundar mais o espectador no universo distorcido e psicologicamente conturbado da franquia, conseguindo lapidar ainda mais a personagem e suas motivações diante do primeiro filme.
Pearl é uma jovem que sonha em ser uma grande estrela da dança e do cinema. Entretanto, ela vive na fazenda de sua família enquanto espera seu marido, um soldado, retornar da Grande Guerra. Com ela, vivem sua mãe conservadora e religiosa (Tandi Wright) e seu debilitado pai (Matthew Sunderland). Sua rotina é monótona e entediante. Seu maior sonho é fugir dali. Ela vê como sua grande oportunidade uma audição para um espetáculo itinerante organizado por uma igreja, tendendo a resolver seus problemas com as próprias mãos. Dessa maneira, o filme se dedica a construir minuciosamente a anti-heroína, interpretada brilhantemente por Mia Goth, que traz consigo uma bagagem poderosa. Ao mesmo tempo em que a loucura advinda dos traumas toma conta da personagem, ela consegue ser carismática. Suas tendências assassinas são impulsionadas pela rejeição, tanto emocional quanto sexual. Apesar de tudo, temos pena dela. Através de um longo monólogo, percebemos a profundidade da personagem, que consegue transmitir suas dores e fragilidades e, logo depois, matar alguém da maneira mais fria e dolorosa possível. Mia Goth fez um trabalho bárbaro! Digo isso não só na atuação, mas ela também escreveu, junto com Ti West, esse prequel.
Pearl soa para mim como uma espécie de Mágico de Oz sombrio. Esteticamente, o filme se caracteriza como um clássico da Era de Ouro hollywoodiana, com cores vibrantes, assim como antiga técnica de Technicolor, e uma atmosfera bucólica contrastante. É lindo de se ver! O vermelho é a cor principal, que se destaca não só pelos detalhes das construções e roupas da personagem, que traz um aspecto de malícia em sua suposta inocência e vulnerabilidade, mas está presente principalmente no sangue. E haja sangue. Aliás, todo o enredo é construído para que essas cenas sangrentas falem mais sobre a assassina do que sobre as vítimas, cumprindo o objetivo de enlouquecê-la até o ápice da sua insanidade em X.
No fim das contas, o longa trata de solidão. Pearl é oprimida diariamente por sua mãe. Seu pai é seu ouvinte porque já não fala ou anda. Sua cunhada a visita de vez em quando, mas a protagonista não pode expor seus sentimentos justamente por se tratar da irmã de seu marido. Pearl chega ao ponto de conversar e se relacionar fisicamente com um espantalho. Essa cena erótica, inclusive, é triste de ser vista. É de uma solidão tão profunda que dói.
O filme eleva ainda mais a franquia. Triunfo este que vem de toda a equipe, mas, principalmente de Mia. Se qualquer outra atriz assumisse esse papel, tenho certeza que não seria tão brilhante. Ela faz um trabalho físico tão espetacular, que até nos créditos ela consegue mostrar o tamanho de sua atuação. Por favor, assistam os créditos desse filme! É um carrossel divertido e profundo de emoções. Sinceramente, um dos melhores filmes de horror dos últimos tempos. Se X já pode ser considerado um clássico, Pearl ganha esse status em tempo recorde.
Filme: PEARL Elenco: Mia Goth, David Corenswet, Tandi Wright, Matthew Sunderland, Emma Jenkins-Purro Direção: Ti West Roteiro: Mia Goth, Ti West Produção: Canadá, Estados Unidos Ano: 2022 Gênero: Terror Sinopse: Situada em 1918, durante a Primeira Guerra Mundial, a história explora as origens de Pearl, vilã do filme “X – A Marca da Morte”. Os eventos se passam antes do primeiro filme e revelam como a cabana onde ocorre o massacre de “X” foi usada durante a guerra. Classificação: 16 anos Distribuidor: A24 Streaming: Não disponível Nota: 9,6 |
Estou sempre me surpreendendo com as críticas do Bernardo Vilela .
Inteligente, bem humorado mas sério e profundo nas análises. Parabéns 👏👏👏👏