47ª MOSTRA SP – Conheça os vencedores e destaques do festival

47ª MOSTRA SP – Conheça os vencedores e destaques do festival

Depois de 15 dias recheados de filmes incríveis – dos premiados em Cannes (Anatomia de uma Queda) a jóias nacionais (O Barulho da Noite) – encerramos a nossa cobertura (completamente independente) da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

O evento de encerramento ocorreu no Espaço Petrobrás, uma sala de cinema ao ar livre construída exclusivamente para o festival na parte externa da Cinemateca. Com apresentação de Renata Almeida, diretora da Mostra de São Paulo desde 2011, e Serginho Groisman, a premiação abriu com uma homenagem lindíssima a Danilo Santos de Miranda, diretor do SESC desde 1984 que faleceu no último domingo de novembro (29) aos 80 anos depois de dedicar a sua vida a fomentar a transformação social através da cultura. Uma perda enorme, mas que deixou um legado gigantesco. Nas palavras de Groisman: “ele não foi nosso Ministro da Cultura, mas poderia facilmente ter sido” – em alusão ao seu extenso trabalho.

O cinema brasileiro viveu uma fase complicada nos últimos 4 anos de governo Bolsonaro, dedicado ao desmonte do audiovisual; mas resistimos. Hoje, o cinema brasileiro também enfrenta uma competição desleal nas salas de cinema. Dito isso, soa emblemático que a premiação do festival se inicie com o Prêmio Netflix e o Prêmio Paradiso, focados na distribuição de filmes brasileiros ao redor do mundo e nas salas de cinemas. 

O júri formado por Gabriel Gurman, da Netflix, a jornalista Flávia Guerra e a diretora Anita Rocha Silveira escolheram o longa baiano de Haroldo Borges: Saudade Fez Morada Aqui Dentro para integrar o catálogo do streaming (ainda sem data). Não ironicamente, o longa também recebeu o Prêmio Paradiso e agora poderá fazer um circuito completo (do festival para as salas, das salas para o streaming). O diretor celebrou a conquista e dedicou os prêmios aos novos tempos: “que nossas histórias possam ocupar todas as telas”.

Após discurso emocionante, Barbara Demerov e Mariane Morisawa subiram ao palco para dar os Prêmios da Crítica de Melhor Filme Nacional e Melhor Filme Internacional, que ficaram respectivamente com O Dia Que Te Conheci, de André Novais Oliveira – que se referiu carinhosamente ao seu filme como “longuinha”, pelos seus 71 minutos de duração – e Afire, do Christian Petzold – que agradeceu encarnando o protagonista de seu filme. Por outro lado, o Prêmio de Melhor Filme Brasileiro de Diretora Estreante, dado pela Abraccine, ficou com o longa Sem Coração de Nara Normande e Tião, escolhido entre filmes dirigidos ou co-dirigidos por mulheres que receberam as melhores notas do público.

Outros prêmios como Direção de Arte e de Ativismo Criativo ficaram com Vale do Exílio e Somos Guardiões, respectivamente. Este último, documentário sobre os povos indígenas e sua luta diária de resistência, também recebeu um aporte de 10 mil dólares (em torno de 50 mil reais). Além de ter sido eleito o Melhor Documentário Nacional pelo público, que abriu essa categoria.

Entre os demais prêmios do público tivemos: Da Cor e da Tinta (vencedor de Melhor Documentário Internacional), que retrata a vida do principal pintor chinês do século 20, Chang Dai-chien (1899-1983). A diretora Weimin Zhang dedicou a consagração a cidade de Mogi das Cruzes, onde Dai-chien viveu por quase 20 anos, depois de ter viajado o mundo. Outro longa que venceu na categoria de Melhor Ficção Internacional, mas com um gostinho de Brasil, foi o italiano La Chimera. A atriz brasileira Carol Duarte, que integra o elenco do filme ao lado de Josh O’Connor e Isabella Rossellini, recebeu as honrarias em nome da produção. A diretora Alice Rohrwacher enviou um vídeo claramente emocionada, agradecendo o público. Em seu discurso ela citou que ela escuta constantemente que seus filmes não são “adorados” pelo grande público e apenas por uma pequena parcela de críticos e “entendedores” e, por conta disso, foi bastante significante esse reconhecimento; e frisou que “o cinema é para quem quiser”.

Um dos prêmios mais importantes – o de Melhor Filme Nacional pelo público – ficou com A Metade de Nós, que narra a história de um casal de terceira idade que perde o único filho, vítima de suicídio, e acompanha como eles lidam com o luto. O diretor Flavio Botelho comentou do quão pessoal é este filme para ele e dedicou o seu prêmio a sua irmã, que também faleceu decorrente do suicídio.

Depois de diversos discursos lindos, que fazem a ode ao cinema num geral – mas principalmente o brasileiro –, foi a vez de subir ao palco o Júri composto pela atriz, diretora, roteirista e produtora Bárbara Paz, Enrica Antonioni (produtora, diretora, roteirista e viúva de Michelangelo Antonioni, cineasta que foi tema desta Mostra), o diretor Lenny Abrahamson (O Quarto de Jack e Normal People) e o ator, produtor e escritor Welket Bungué (Crimes of the Future). Mariëtte Rissenbeek (diretora do Festival de Berlim) e Emir Kusturica (diretor de Underground – Mentiras de Guerra e homenageado com Prêmio Leon Cakoff) não puderam comparecer à cerimônia.

Os prêmios do Júri se iniciaram com duas Menções Honrosas. A primeira de Melhor Interpretação dado a Jaya, pela sua atuação no filme Asog, que retrata a vida de uma pessoa não-binária e apresentadora de talk show que precisa se recuperar financeiramente após um desastre natural atingir as Filipinas. E a segunda foi para Se Eu Pudesse Apenas Hibernar da diretora Zoljargal Purevdash, exibido em Cannes na seção de Un Certain Regard, que conta a história de um adolescente que precisa abrir mão de seus sonhos para ganhar uma bolsa de estudos. Enquanto isso, o prêmio de Melhor Filme ficou para Quando Derreter, dirigido por Veerle Baetens e adaptado do romance Hel Smelt (Lize Spit), onde presenciamos a jornada de uma protagonista confrontando os fantasmas do seu passado. Já o de Melhor Documentário ficou com Samuel e a Luz: ambientado em Paraty, o documentário acompanha Samuel e sua filha por 6 anos. É a partir do crescimento do garoto e da chegada da modernidade – com ela a eletricidade, turismo e novas tecnologias – que a produção se desenvolve e desenha um retrato do Brasil contemporâneo. O diretor brasileiro Vinícius Girnys estava presente e recebeu as honrarias.

Para encerrar, tivemos um momento não programado em que Serginho Groisman aproveitou alguns minutos para celebrar a jornada e trabalho de Renata Almeida, cuja a história da Mostra se confunde com a do desenvolvimento e resistência cultural do Brasil. Depois, o ator brasileiro Gabriel Leone subiu ao palco para apresentar o filme de encerramento: Ferrari (crítica em breve), dirigido pelo lendário Michael Mann. Ele comentou do privilégio de trabalhar com o diretor dono de filmes como Fogo Contra Fogo e Colateral e de contracenar ao lado de nomes como Adam Driver e Penélope Cruz, ao mesmo tempo que agradeceu ao produtor brasileiro Rodrigo Teixeira (O Farol e A Bruxa) por ter ajudado a conseguir o teste. Vale destacar que Ferrari está na temporada de premiação e promete ser uma grande aposta em todas as categorias, principalmente nas mais técnicas. 

A 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo foi ótima. Com momentos emocionantes, programação diversa e muitas oportunidades de troca com pessoas incríveis, que compartilham o mesmo amor pelo cinema. Em seu fim, ficou claro que esta Mostra, acima de qualquer coisa, foi sobre celebrar os novos ares, muito mais otimistas para a cultura e audiovisual brasileiros. A Mostra de 2023 trouxe muito mais reconhecimento para obras dirigidas por mulheres, um alento numa indústria ainda muito machista. Sobre celebrar o Brasil e mostrar como o nosso cinema ganha cada vez mais espaço no mundo todo, onde recebemos artistas de fora (Abrahamson e Antonioni, por exemplo), observamos a influência do Brasil em produções internacionais (do amor e respeito da americana Chelsea Greene, uma das diretoras de Somos Guardiões, a irreverência a Mogi das Cruzes da realizadora chinesa), conhecemos obras fantásticas, vimos cinemas de rua lotados, reverenciamos nomes importantes do nosso audiovisual (de Serginho a Bárbara Paz) e aplaudimos novos nomes – como o de Carol Duarte e Leone – que estão desbravando novas fronteiras e cinemas mundo a fora.

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