CRÍTICA – MURIBECA

CRÍTICA – MURIBECA

O longa começa interessante, estimulante, com voz off de um poeta, imagens de arquivo de uma cidade pequena em festa, no Carnaval e na Copa do Mundo. As ruas pintadas, a música alta, as pessoas aglomeradas.

Após as cenas festivas, silêncio. Longos takes de destruição e vazio, e assim se dá a denúncia do filme: a cidade outrora tão colorida e movimentada agora parecia um cenário distópico. 

“Daqui não saio, mas… tão me tirando daqui aos poucos.”

Muribeca’ é conduzido por diversas entrevistas entre pessoas que ainda resistem na comunidade. Todas as personagens são interessantes e têm algo para falar, demonstrando seu carinho pelo lugar no qual tentam sobreviver, mas não demora muito para a dinâmica do filme ficar cansativa.

Em meio a tantos relatos enquadrados em primeiro plano pelo ponto de vista de uma câmera parada, a sensação que fica é a de que o longa, assim como a câmera, não se movimenta, não evolui. 

Os entrevistados falam sobre sua vida antes do abandono da comunidade pelo governo e assistimos a paisagem destruída. Em curtos períodos entre essa dinâmica já definida, vemos algumas performances artísticas de moradores, que, por sua vez, são os pontos mais instigantes do longa. O problema é que não é dada a devida continuidade que esses relatos mereciam. Ao meu ver, havia força o suficiente no relato de algum dos artistas a ponto de que virassem o fio condutor de toda a história, virando a chave para outro ato na narrativa, outra fase, com outra perspectiva.

O filme ganha muito ao mostrar esses artistas e suas intervenções que se perderam junto de sua comunidade e é comovente perceber como eles ainda não desistiram dela. Porém, por maior potencial que tivessem, esses momentos se perdem entre outros tantos relatos presentes, mesmo com sua unidade temática e até bons elos visuais entre si. Para mim, não há uma progressão, e sim um amontoado de histórias, com o mérito de serem bem selecionadas, mas sem uma unidade narrativa. 

Esperança

“Comunidade”, “família”, “ponto de encontro” é como se referem ao conjunto.

A sequência final do filme evoca, pela última vez, a arte que ainda sobrevive naquele lugar, e, por alguns momentos, dá para sentir que ainda há esperança de melhora.

É lindo ver como a memória afetiva está enraizada naquele lugar, que pareceu ser, um dia, um lugar maravilhoso para se viver. Cada um resiste de uma forma, e alguns não tem nada a oferecer para a articulação do movimento contra a destruição da comunidade a não ser continuar morando em condições precárias, ocupando o que lhe é próprio por direito.  

No entanto, a fotografia e a colorização do filme passam outra mensagem, acentuando o tom de luto já retratado pelas palavras e pelos semblantes dos personagens, de modo que, mesmo quando nos é apresentada a mobilização de alguns deles contra a destruição do conjunto, a sensação que permanece é a de pessimismo, de batalha perdida. 

‘Muribeca’ é uma denúncia válida e importante que poderia ter sido feita em um média ou curta metragem. Sua linguagem se torna repetitiva após a apresentação dos seus primeiros personagens e o longa fica engessado, mesmo tendo em mãos uma boa pauta e bons personagens. 

 

Filme: Muribeca
Direção: Alcione Ferreira, Camilo Soares.
Roteiro: Alcione Ferreira, Camilo Soares.
Produção: Brasil
Ano: 2020
Gênero: Documentário
Sinopse: Diante da iminente transformação de seus lares em uma verdadeira cidade fantasma, moradores do Conjunto Habitacional Muribeca expressam a morte física de uma comunidade ainda viva na memória e nos sentimentos. O desaparecimento do bairro (em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco) devido a problemas estruturais, à especulação imobiliária e a um longo e turvo imbróglio entre moradores e órgãos responsáveis pela obra, é testemunhado a partir de resiliências e resistências, de paisagens afetivas e lembranças, que ora buscam abrigo na nostalgia, ora reacendem a chama resoluta da esperança.
Classificação: 10 anos
Distribuidor: Descoloniza Filmes
Streaming: Indisponível
Nota: 7,0

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