AZOR

AZOR

Azor, filme que marca a estreia do diretor suíço Andreas Fontana, é extremamente político e, coincidentemente, também se debruça, ainda que pouco, sobre a política argentina do final da década de 70 e início da década de 80, período, este, em que estava instaurada uma ditadura militar no país.

Quando o defino como um filme político, quero dizer que o diretor sabia em que ferida iria tocar, ele quis registrar aquele momento mas o fez de forma leve e, extremamente, superficial. A violência policial e a repressão aos jovens se resumem a duas cenas e nada mais. Jamais seria o suficiente para criar a ideia de um ambiente hostil. Sendo assim ele não alcança esse objetivo, nem com o espectador e muito menos com o protagonista, Ivan de Wiel (Fabrizio Rongione).

O trabalho feito em cima do personagem Ivan nos mostra alguém completamente deslocado e desconcertado naquela posição que agora ocupa. Ele precisa fazer o que seu antigo sócio Keys fazia, precisa passar confiança aos antigos clientes de seu banco, mesmo sem saber o que dizer sobre o paradeiro de seu sócio – quem tratava diretamente com estes clientes – e precisa, por fim, garantir novos negócios, afinal é assim que seu banco sobrevive.

É nesta parte da trama que o longa consegue prender nossa atenção. Se a ditadura não se mostra como um perigo real – há, no entanto, uma construção de um medo sobre a economia do país e em como isso afetará a população –, essa entrada de Ivan na elite argentina configura, sim, em riscos, sobretudo, quando há uma ambiguidade em quase todos os personagens com quem se encontra. Além disso Fontana não quer fazer de Keys um nome apenas especulado, então joga Ivan em um labirinto de informações. Um labirinto que é, de forma inteligente, exemplificado pelo apartamento abandonado e cheio de portas do próprio Keys. Mas é intenção do diretor pontuar todas essas incertezas que pairam sobre quem é ou quem foi Keys e, para isso, constrói, através de pessoas que o elogiem e outras que que o quisessem longe, gerando uma confusão de sentimentos em Ivan e em nós também. Afinal quem está falando a verdade? O que será que de fato aconteceu com Keys? Estas perguntas nos martelam do início ao fim, mas no fundo não se mostra relevante, pois o filme se desenvolve, e de fato esta é a lógica interna de Azor, através de Ivan.

Se a direção consegue, mesmo sem mostrar o personagem, definir um suspense sobre o paradeiro de Keys, tal objetivo não é conseguido com a situação incomoda vivida por Ivan, o qual está sempre um passo atrás de todos aqueles com quem se encontra. Algo que é irritante são as idas e vindas dos mesmos personagens, mas sem trazer nenhuma novidade para trama, apenas repetem as mensagens já ditas anteriormente. Ou seja, não estão ali para marcar um ponto e visualizarmos os caminhos a seguir, não, estão ali apenas para reafirmar um estado de estagnação da trama e do personagem. São esses momentos que incham o longa e cansam o espectador.

São tantas visitas que nos perdemos depois da terceira. Sempre com uma negativa em relação aos negócios propostos por Ivan, estes encontros, costumeiramente, apresentam subtramas numa tentativa sem sucesso de fortalecer aquele ambiente militarizado no qual pessoas somem, casas são revistadas e bens são confiscados. Mas novamente afirmo que tais situações colocadas apenas na forma de diálogos entre personagens não causam nenhum efeito no sentido de atingir o objetivo que, claramente, seria mostrar o estado de alerta daquele país. A grosso modo, a trama sequer é influenciada diretamente pela ditadura.

Uma personagem de fundamental importância e que funciona como uma engrenagem para que os objetivos de Ivan sejam alcançados é sua esposa Inêz (Stéphanie Cléau). Ela, que muitas vezes parece ter ido a argentina a passeio, pelos seus constantes banhos de piscina, é determinante para o ritmo não só do filme, como de seu marido. É após incitar Ivan com a seguinte frase “O medo o torna medíocre”, que ele percebe o que está deixando passar por uma certa apatia que não condiz com sua missão naquele país.

E se, em um começo morno, burocrático, somos apresentados a um Ivan de Wiel preocupado com a ética, moralidade e bons costumes, é após esse confronto com sua esposa que, enfim, consegue dar andamento aos negócios. É aí, também, que há uma crítica forte citando o envolvimento da igreja com os militares – o que não é nenhuma novidade –, que diante de todas as atrocidades cometidas nesse período, se justificam através do mantra “fase de purificação”, remetendo a uma ideia de reeducação da juventude.

Mas é quando ficamos a par do significado da palavra Azor, que o filme e, principalmente, o comportamento do protagonista começam a fazer sentido. Azor faz um paralelo com discrição. E se tem uma coisa que define o personagem Ivan é isto. Ele ouviu muito de cada um dos seus prováveis clientes. Ouviu sobre o período da Argentina, sobre seu sócio, sobre rumores de um futuro próximo, ouviu ameaças, mas sempre se portou de forma a extrair o máximo daquele conjunto de informações, para só assim, determinar cada passo dado.

Mesmo com essa inteligência do roteiro, escrito pelo próprio Fontana junto com Mariano Llinás, o longa não consegue sair de uma temperatura morna que combina bastante com os tons frios que permeiam cada cena. Há uma sensação final de que muito tempo foi gasto em um filme que se enrola com uma trama sem objetivo. Que confunde e não apresenta qualquer desfecho sobre muitos questionamentos. Desta forma, ainda que o fim subverta as expectativas sobre o protagonista, o filme em momento algum chega ao clímax.


Filme: Azor
Elenco: Fabrizio Rongione, Elli Medeiros, Pablo Torre Nilson, Alexandre Trocki, Stéphanie Cléau
Direção: Andreas Fontana
Roteiro: Andreas Fontana e Mariano Llinás
Produção: Suíça, França, Argentina
Ano: 2021
Gênero: Drama, Suspense
Sinopse: Yvan De Wiel, um banqueiro privado de Genebra, viaja para a Argentina durante a Ditadura no país para substituir seu sócio, objeto de rumores preocupantes, que desapareceu sem deixar vestígios. Entre encontros discretos, piscinas e jardins sob vigilância, um duelo remoto entre dois banqueiros que, apesar dos métodos distintos, são cúmplices de uma forma de colonização discreta e sem piedade.
Classificação: 12 anos
Streaming: Não disponível.
Nota: 6,6

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