12º Olhar de Cinema – Dia 03

12º Olhar de Cinema – Dia 03

O terceiro dia de festival foi marcado por algumas situações. A primeira aconteceu com o primeiro filme do dia, Salomé. A sessão era as 14:30 e, até segundos antes de iniciar o filme, eu acreditava que estava ali para assistir ao filme de 1953, do diretor William Dieterle, mas a obra que fazia parte da Mostra Olhares Clássicos era Salomé de 1922. Apesar da confusão e de eu ter mencionado diversas vezes o filme de 1953 em stories e reels no instagram do Club do Filme (que vergonha!), a experiência foi muito melhor do que eu achei que iria ter, principalmente, por poder ter acesso na telona a um filme tão antigo, preto e branco e que faz parte do cinema silencioso. Mais um presente do Olhar de Cinema para o seu público.

Já em relação às duas obras exibidas a noite, Quando Eu Me Encontrar (Competitiva Brasileira) e No Cemitério do Cinema (Competitiva Internacional), infelizmente não pude vê-las no cinema e, pior, sequer consegui o screener de No Cemitério do Cinema, sendo este o único dentre as 12 obras das duas competitivas que não pude ver de forma alguma.

Em casa assisti ao filme brasileiro Quando Eu Me Encontrar e, assim como percebi algo compartilhado nos três filmes assistidos no segundo dia, aqui também pude notar uma similitude entre esta obra e Salomé. Ambas se desenvolvem em torno de figuras femininas que, direta ou indiretamente, interferem na vida daqueles que as cercam.

 

QUANDO EU ME ENCONTRAR

 

Escrevo o texto considerando este filme como o melhor da competição até o momento. Entretanto ainda que o Olhar de Cinema tenha chegado ao fim na noite de ontem e, nesta ocasião, tenhamos conhecido os vencedores das diversas categorias, me falta, ainda, um filme brasileiro para assistir, O Estranho – que venceu as categorias de Melhor Direção de Fotografia e Melhor Som.

O filme começa e já somos embalados pela letra que ficou consagrada na voz do mestre Cartola da música Preciso Me Encontrar do compositor Candeia. Nesta produção cearense ouvimos duas vozes femininas cantarolando os estrofes da música em meio a uma noite que reverbera os risos frouxos dessas duas personagens. As diretoras Amanda Pontes e Michelline Helena já deixam claro que ali estava Dayane, personagem central deste longa. A música, então, cantada se mostra, ao longo do filme, como mais uma obviedade das motivações de seu sumiço repentino – situação que remete ao primeiro filme que assisti no Olhar, Desvío de Noche.

Com a ausência de Dayane, as diretoras emergem, então, três outras personagens. A senhora Marluce (Luciana Souza), mãe de Dayane, Mari (Pipa), sua irmã e Antônio (David Santos), seu noivo (ou ex-noivo). A trama, desta forma, gira em torno da ausência de Dayane na vida dessas três pessoas. Uma mãe fria, que usa como desculpa a dureza de sua vida para sustentar e dar uma vida melhor às suas duas filhas. Uma adolescente de periferia estudando em uma escola de classe média por causa da bolsa que ganhou, mas precisando aturar o preconceito – aqui ele é subtendido, mas fica claro na primeira conversa que tem com sua amiga Ana Paula – e um homem, machista e possessivo, que não suporta a ideia de ter sido deixado. Muito embora as diretoras não se aprofundem em nenhum desses personagens, aquilo que é mostrado (como exemplo pego o quarto de Dayane e os dois quadros que decoram aquele ambiente – um com diversas palavras, incluindo Happy, mas por demais desgastado, com as letras quase apagadas, o outro contendo a imagem de um palhaço não muito feliz, em um espaço sem muita vida, refletindo justamente a falta de alegria daquele quarto) e o que é desenvolvido (a repetição das histórias, pois Marluce também saiu de casa e possui problemas não resolvidos, até hoje, com sua própria mãe) satisfaz para a trama.

Demora um pouco, mas quando menos percebemos estamos imersos à obra. É bem verdade que a atuação de Luciana Souza – a quem coloco como uma das grandes responsáveis pelo sucesso de Ó Paí,Ó –, soou um tanto forçada, o que me desconectou do filme em determinados momentos, mas, de forma inteligente, a presença de uma outra personagem fazia tudo voltar aos trilhos. Cecilia (Di Ferreira) é uma amiga de Dayane e canta nas noites de Fortaleza em um barzinho. A trilha sonora, diegética, tem muita força em Quando Eu Me Encontrar. Ela é responsável por mensagens sobre e para alguns personagens. E algumas das músicas que compõem a bela trilha sonora do filme fora cantada, lindamente, por Cecilia.

A música é um elemento muito presente neste longa, seja cantada ou entoada. Mas ela só pertence às personagens femininas. Vemos Marluce, Mari, Cecilia e a própria Dayane cantando, mas Antônio não. Isso reflete muito na forma que cada um vive. Longe de querer colocar cada personagem em uma régua, para assim medir o valor de cada um, as diretoras, ainda assim, provocam ao colocar mulheres com dores palpáveis e superando-as ao passo que demonstra um homem apequenado em seus gestos egoístas. Há, ao menos, um caminho de esperança para todos eles. É um primeiro passo. Esta é a beleza do filme.

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