CRÍTICA – HORIZONTE

CRÍTICA – HORIZONTE

“Horizonte” é um drama familiar que tem uma premissa bastante boa, centrada em personagens idosas, muitas vezes esquecidas por cineastas jovens. E isso, a meu ver, já faz dele um filme interessante.

Pode-se dizer que está divido em três partes, sendo a primeira delas um tanto dispensável. Isso porque, em primeiro lugar, contribui pouco para o segundo momento do filme — aquele que merece um pouco mais de atenção; depois, porque está mal dirigido mesmo, infelizmente. Pior que isso, acredito que as personagens estão mal construídas, pois são apenas caricaturas: o pai excessivamente autoritário (risível), a mãe excessivamente submissa (idem), a filha sem graça, sem sabor, e o filho meio idiota, um sujeito fraco, confuso e sem iniciativa, talvez o único verossímil, aliás, porque, de certa forma, acaba sendo o retrato da atual geração de rapazes.

Se os personagens desde o roteiro estivessem melhor construídos e os atores, durante a filmagem, estivessem mais bem trabalhados, o plano-sequência inicial teria jogado a favor do filme. Como isso não aconteceu, ele acaba jogando contra. Melhor seria tê-lo descartado, pois a câmera parece perdida, sem saber muito o que fazer diante de uma dinâmica pouco criativa, quase engessada. Se houvesse abandonado o plano-sequência, o diretor teria tido maior controle da mise-en-scène e administrado melhor o tempo dos diálogos, as trocas de olhares, as tensões sutis e os pequenos deslocamentos pelo espaço — e o primeiro momento do filme poderia ter sido brilhante. Algo como a cena do jantar de “Valmont”, de Milos Forman.

Rui, protagonista do filme, contrariado com a família, desprezado e humilhado por eles, vai morar de modo completamente inverossímil numa vila de idosos. Uma benesse de um Brasil imaginário, uma espécie de “Minha Casa, Minha Vida” de contos de fadas, algo inaceitável num filme de chave realista, que deveria prezar pela objetividade, pelo factual e por situações cotidianas que espelham um mundo minimamente reconhecível pela totalidade dos brasileiros.

Mas esqueçamos isso. Vamos imaginar que “Horizonte” comece com Rui chegando nesse condomínio dos sonhos, sem explicações fantasiosas e pouco críveis. Poucos dias depois, na frente da sua casa, vem morar Jandira (Ana Rosa), ambos solitários. A partir daí “Horizonte” passa a fazer sentido, justificando os prêmios que ganhou em diversos festivais dentro e fora do Brasil.

A aproximação dos dois se faz de modo sutil, divertida, bem construída tanto do ponto de vista das atuações quanto do ritmo bem dosado. Rui persiste teimosamente e Jandira resiste, cedendo aos poucos, à conta-gotas, como deve ser para uma mulher experiente, cautelosa, que conhece os homens, suas fraquezas e virtudes — porque, por incrível que pareça, os homens também podem ser virtuosos, apesar dos canalhas de todos os tempos e de todas as idades e lugares. A aproximação dos dois é inevitável e desejada.

Há, então, uma reviravolta típica de oficina de roteiro e o filme termina como previsto. “Horizonte” reflete o atual estado do cinema brasileiro contemporâneo. Não é ruim, mas poderia ser infinitamente melhor. Outro mérito do filme: foge dos temas da moda. Levaria minha mãe — que é noveleira — para assistir. E isso não é um demérito, acredite.

Revisão: Vanina Cruz


Filme: Horizonte
Elenco: Suely Franco, Raymundo de Souza, Alexandra Richter, Ana Rosa, Pérola Faria, Ronan Horta, Arthur de Farah, Paulo Vespúcio
Direção: Rafael Calomeni
Roteiro: Dostoiewski Champangnatte
Produção: Brasil
Ano: 2023
Gênero: Drama
Sinopse: Rui (75) é solteiro e mora sozinho nos fundos da casa do irmão, que acabara de falecer. Seu sobrinho se muda para ali, com a família, e sua vida se torna insuportável.
Classificação: 14 anos
Distribuidor: A2 Filmes
Streaming: Indisponível
Nota: 6,5

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