A LUZ DO DEMÔNIO

A LUZ DO DEMÔNIO

 

“A Luz do Demônio” é um filme de terror que se utiliza de um cenário muito comum a outros filmes do terror que ouso adjetivar como “simbólico” ou “religioso”. Algo capaz de, nas entrelinhas, no subliminar, lembrar um ditado popular que diz “Pelo amor, ou pela dor, por respeito ou por medo”. Tal ditado se aproxima da didática católica porque a Igreja há milênios apresenta um mal que só ela conhece, e, justamente por isso, esconde os segredos. Mal esse que somente a própria Igreja, detentora dos segredos do mesmo, pode derrotar. Existe, segundo essa didática, algo de terrível que atinge sobretudo aquelas que não são totalmente descrentes mas que, por alguma razão recente estão com a fé e o espírito fragilizados. Ou, quem sabe, aquelas que foram amaldiçoadas por alguma força do passado. Por isso o inimigo também onisciente e onipresente, escolheu para corroer a alma.  Segundo a teoria católica, para evitar tão tragédia, no entanto, é fundamental que a única conhecedora e detentora dos mistérios do inimigo intervenha. Tal figura tão poderosa é a própria igreja. Porém, se a alma for corroída, a Igreja não será derrotada. Afinal, se isso acontecer, é porque a alma em questão já não estava suficientemente próxima do deus cristão. Aquelas que assim estão, permanecem salvas e perdoadas. Agora, se ocorre o contrário e a Igreja sai vitoriosa do tal exorcismo, então a mesma está à frente da eterna batalha do bem (Igreja) contra o mal (inimigo). Inimigo esse que já tem seus conhecimentos, armas e segredos na mão da Igreja. E a guerra busca ser ad infinitum.

Aqui talvez caiba a pergunta: até que ponto o medo motiva mais do que o desejo verdadeiro? Repito o ditado popular: “pelo amor ou pela dor, por respeito ou por medo”. Um lema patriarcal, bélico, que caberia muito bem na boca de um deus vingativo, como o pintado pelas posturas cristãs. 

O filme “A Luz do Demônio” também tem um fator ainda mais relevante e presente na História do Catolicismo e do Ocidente: a invenção/implantação da eterna e inevitável falha do feminino que nunca, jamais, alcançará a glória de ser como Maria, a mulher e mãe perfeita. Mas que também não será tão poderosa quanto Eva.

E sim, o filme ainda representa precisamente a frase de Santo Agostinho “A mulher é a porta por onde entra o diabo”. Como o filme o faz? Resumidamente, a história do filme é sobre uma força inimiga que passa de mãe para filha. As possessões são todas em mulheres. Em certo momento é possível sugerir que uma mãe abandonou sua filha porque teve uma péssima mãe. E é nessa ferida que a força inimiga busca morada. Quer dizer, mais do que pecado: alojamento para o diabo. Não há no filme menção semelhante a homens possuídos por abandonar os filhos ou por qualquer outra razão. 

O curioso é que nada abala ou anula a inteligência e proeminência da personagem principal. O contrário: reforça que não importa quão inteligente, talentosa e potente seja uma mulher, de acordo com as nuances da narrativa histórica patriarcal e também as nuances do filme em questão, a culpa por ser ou não ser mãe, deve ser soberana. E, claro, é aos pés de Maria que tudo há de se dissolver. Busquemos a Mãe Mais Que Perfeita!

O filme “A Luz do Demônio” que estreará amanhã nos cinemas dos shoppings centers do Brasil, é um filme de terror ágil, conciso e familiar. Familiar porque faz uso de um cenário muito conhecido por habitar mistérios, segredos, bençãos e temores: a Igreja Católica. O roteiro do filme “A Luz do Demônio” sabe a fórmula e quer realizá-la  com o acréscimo de duas “novidades”: o ritmo acelerado dado pela sua edição e um roteiro que traça uma ponte indiscreta que anuncia que pode/deve vir  sequência da franquia. É um suco de consumo leve, embora de terror, distraído, comum e emocionante. Cumpre seu papel básico: emociona, desperta, arrepia e até assusta, mesmo que com raras surpresas verdadeiras. O que também é bom. Mesmo que sem nenhum avanço representado na narrativa ou na linguagem. Percebe-se que muito, quase tudo, o que eu disse sobre o filme em questão é dado histórico, milenar, pilar do Ocidente. São histórias que já conhecemos de tanto que nos habitam. Agora, queremos ir além?


Filme: A Luz do Demônio ( The Devil’s Light)
Elenco: Jacqueline Byers, Virginia Madsen, Ben Cross (I) Christian Navarro, Colin Salmon, Nicholas Ralph
Direção: Daniel Stamm
Roteiro:Robert Zappia
Produção: Estados Unidos da América
Ano: 2022
Gênero: Terror
Sinopse: A Irmã Ann é a única mulher na escola voltada a treinar padres aptos para praticar exorcismos e, mesmo assim, acredita que seu destino é realizar exorcismos. Quando um professor sente seu dom especial, permite que ela seja a primeira freira a estudar e dominar o ritual. Sua própria alma estará em perigo, pois as forças demoníacas que ela luta contra, revelam uma conexão misteriosa com seu passado traumático.
Classificação: 14 anos
Distribuidor: Paris Filmes
Streaming: Indisponível
Nota: 5

Sobre o Autor

Share

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *