CRÍTICA – O MUNDO DEPOIS DE NÓS

CRÍTICA – O MUNDO DEPOIS DE NÓS

A Netflix constantemente tenta se renovar, mas permanece como a mesma realizadora de largo alcance ao público médio. Os longas-metragens com temáticas de devastação (Próxima Parada: Apocalipse, Bird Box e Extinção, todos de 2018) deixam isso claro. Todavia, nenhum destes obteve sucesso de crítica. O Mundo Depois de Nós

A aposta desse ano, mais uma vez a adaptação de um romance, consegue ser ainda mais fajuta. O Mundo Depois de Nós é dirigido pelo criador da série Mr. Robot, o americano de origem egípcia Sam Esmail – série que, a princípio, explora temáticas dentre a proliferação de conspirações – o que também é trabalhado em seu mais recente longa-metragem. Contudo, nota-se que, em quaisquer entrelinhas, absolutamente nenhum tema consegue ser trabalhado. Ou melhor: até é, se for dado os limites de um diretor com a maturidade de um adolescente.

Sem ao menos oferecer qualquer senso contínuo de ameaça (ou seja, entretenimento para um filme de catástrofe), o filme se propõe, na verdade, à críticas à “malvada” sociedade atual (seja na estrutura ou na superficialidade limítrofe dos diálogos). São críticas rasas, mal escritas, e que soam como um “rage” adolescente, referentes a autodestruição da humanidade. A própria abertura, em que Ethan Hawke pergunta à sua esposa o motivo da viagem em família de última hora, Julia Roberts responde de modo forçado a fazer com que diga que “odeia as pessoas”. Sim, uma robusta e orgânica crítica à sociedade.

Ironias à parte, o tom constrangedor se alastra por quase todos os fatores do filme. Enquanto o roteiro se vende como intelectual com pseudo perícias dos comportamentos humanos e políticos (presumidamente guerras, preconceito e religião), até cenas que poderiam funcionar isoladamente acabam sendo constrangedoras: e a péssima atuação da Julia Roberts lidera o desfalque de naturalidade da produção. A forma que ela dança, que questiona as ações do marido, que trata os acontecimentos ao seu redor, o jeito que se expressa; é tudo tão clichê, forçado e tosco.

À aflição vivida pela família branca com a chegada da família negra (os donos da casa utilizada como Airbnb) também detém péssimos e rasteiros diálogos em que pouco ou nada funciona. O que minimamente gera alguma curiosidade, é desvendar a origem do início dos “acontecimentos”, o que positivamente faz repercutir o debate da forma com que boatos e conspirações se espalham e fixam rapidamente. Exemplo (sem spoilers) é no momento em que um avião despeja milhares de panfletos em idioma árabe, instaurando então o conceito prévio de um ataque político-cultural ou racial de um povo já estereotipado como terrorista, mesmo que não haja e nem seja desvendado nada que confirme isto. Infelizmente, essa pincelada pontual não reflete o conjunto final da obra, que é sonso, desapegado e imaturo.

Cenas de ação também não ficam ilesas: durante uma “fuga” de carro na estrada, apenas sair da pista (ao redor é uma acessível planície de terra) nunca é cogitado; quando um avião comercial Boeing cai na praia, o personagem de Mahershala Ali basta entrar em uma casa que escapa de qualquer arranhão (o raio de devastação da queda desse avião seria imenso). E todas essas cenas são dirigidas com planos “autorais” que, depois dos 10 minutos de filme, já são insuportáveis. É como se, de forma infantil, a cada enquadramento o diretor fizesse questão de estampar seu talento. O resultado são enquadramentos pífios e planos-sequência enjoados.

O enfoque é tão grande para seu próprio umbigo que o também roteirista acaba “esquecendo” de adicionar um clímax funcional para seu filme, tornando uma cena anticlimática com o subaproveitado Kevin Bacon, o desfecho ali cabido, e pior, é aí que os clichês entram no auge, com direito até a um “momento explicação” da parábola com uma montagem de recorta cenas passadas com um voice over apenas com frases genéricas sobre a forma que a sociedade reage ao fim do mundo (virando-se umas contra as outras, etc). E da mesma forma que crê e leva a sério suas simulações de críticas sociais, Sam Esmail também acredita que é um mega diretor perito em suspense, ao constantemente aproximar a câmera em direção aos rostos de seus atores, sem revelar a “chocante descoberta”. A única revelação deste comportamento autoral, portanto, é a de sua imaturidade e soberba ao, enganosamente, tentar impressionar e dizer ser o que não é.

Parece que ao tentar emular M. Night Shyamalan com a estética de Alfonso Cuarón, o diretor pouco experiente Sam Esmail não consegue perceber que, diferente dele, estes cineastas costumam adicionar áureas para seus filmes; sustança essa que é absolutamente desprovida em O Mundo Depois de Nós, a recente produção que, queira quer não, foi um sucesso para a Netflix, mas que carece de tudo do qual se promove a oferecer.

Observação: A cena do navio na praia, nos 15 minutos iniciais, é a única que rende algo de interessante.


Filme: Leave The World Behind (O Mundo Depois de Nós)
Elenco: Julia Roberts, Mahershala Ali, Ethan Hawke, Myha’la Herrold, Ferrah Mackenzie
Direção: Sam Esmail
Roteiro: Sam Esmail
Produção: Estados Unidos
Ano: 2023
Gênero: Suspense, Ficção Científica
Sinopse: Durante a viagem para uma casa de praia alugada pelo Airbnb, uma família passa a presenciar estranhos eventos que podem ter relação com o fim dos tempos.
Classificação: 16 anos
Distribuidor: Netflix
Streaming: Netflix 
Nota: 3,0

Sobre o Autor

Share

One thought on “CRÍTICA – O MUNDO DEPOIS DE NÓS

  1. Eu gostei bastante do filme para matar o tempo, apesar de ser um mistério bobo, sem o olhar profundo de um crítico, prendeu bastante minha atenção. Somente o final que foi bem decepcionante pra mim. Fiquei bastante atento e curioso durante todo o filme pra no final, simplemente parecer que não houve final. Apenas subentende-se que os EUA “acabou”. Mas nada é explicado, enfim. O final foi mt riim

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *