7 filmes de diretoras negras

7 filmes de diretoras negras

A única coisa que separa as mulheres negras de qualquer outra pessoa é a oportunidade” – disse Viola Davis ao ser a primeira mulher negra a ganhar o Emmy de Melhor Atriz em Série Dramática.

Numa outra entrevista ela complementa falando sobre o seu currículo. De como ela caminhou os mesmos passos que nomes como Meryl Streep, Sigourney Weaver, Julianne Moore e, ainda assim, ela não está nem perto delas em oportunidade de trabalho e pagamentos.

Em quase 100 edições do Oscar, nenhuma mulher negra foi indicada na categoria de Melhor Direção (a mais próxima do feito foi Ava DuVernay com Selma, que foi indicado em Melhor Filme; mas ela não). Em quase 100 edições do Oscar, apenas uma mulher negra (Halle Berry) e outra asiática (Michelle Yeoh) venceram em Melhor Atriz. Nenhuma roteirista negra teve uma história contemplada pela Academia. Hattie McDaniel, a primeira artista negra a ganhar um Oscar, pediu que fosse enterrada no cemitério no Hollywood Forever ao lado dos seus pares; o seu desejo nunca foi realizado, pois o local não aceitava negros.

Neste Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, nós, do Club do Filme, convidamos a nossa audiência a refletir sobre essas palavras poderosíssimas de Davis, que, infelizmente, não envelheceram tanto e sobre a diversidade no cinema.

Dito isso, separamos uma lista imperdível de 7 filmes incríveis, culturalmente e historicamente relevantes dirigidos por mulheres afro americanas e latinas negras.

De Cierta Manera

O filme que me inspirou a criar este conteúdo no Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. 

De Cierta Manera é o primeiro e único longa-metragem de Sara Gómez, a primeira e única cineasta de Cuba. Nessa história pós-revolucionária acompanhamos uma história de amor entre Yolanda, uma professora de classe média, e Mário, um operário nascido e criado no bairro pobre de Miraflores. De mundos distintos, a primeira tem um choque de realidade ao se deparar com uma realidade que acreditava estar extinta. Por outro lado, a sua independência e suas opiniões fortes constantemente entram em conflito com as ideias machistas de Mario. 

É um filme sobre conflito, paz e resolução, que metaforiza, de certa maneira, a própria revolução cubana. Pois, assim como o relacionamento dos dois, para que a revolução funcionasse da forma que fora idealizada, os conflitos de classes deveriam se extinguir e amenizar. 

Em paralelo ao desenvolvimento da trama, Sara Gómez desenha uma linha quase imperceptível entre documentário e ficção. Aqui os personagens e sua lente nos guiam, através de uma narração jornalística, pela cultura, traz reflexões socioculturais e mostra o povo e os seus costumes; tudo isso com uma clara mensagem anticolonialista. 

Num geral, o longa é claramente inspirado no cinema de Agnés Varda – especialmente Salut les Cubains, em que Sara Gómez trabalhou como diretora assistente e se tornou amiga da documentarista francesa no processo.

Infelizmente, Gómez faleceu com apenas 31 anos e não chegou a ver seu filme finalizado. Mas felizmente, o seu legado e sua visão artística vivem para sempre através de De Cierta Manera.

Disponível com exclusividade no Mubi

Amor Maldito

Aqui no Brasil. Adélia Sampaio foi a primeira diretora negra a dirigir um longa-metragem: Amor Maldito, em 1984. Baseado numa história real, o filme apresenta a relação amorosa entre Fernanda e Sueli, que ganha contornos trágicos quando esta última comete suicídio e sua amada é acusada de ser responsável, sendo julgada por um tribunal preconceituoso. 

Apesar de deixar a desejar em alguns aspectos, Amor Maldito é tematicamente relevante e mostra como pessoas LGBTQIAP+, principalmente mulheres, eram vistas pós-ditadura. Não é por mais que Adélia Sampaio tenha encontrado diversas dificuldades para distribuir a sua produção pelo Brasil, sendo rejeitada pela Embrafilme, por exemplo, e obrigada a lançar seu filme com o selo de Pornochanchada.

Disponível no canal da diretora no Youtube

Café com Canela

Dirigido por Glenda Nicácio, em parceria com Ary Sousa, Café com Canela é uma história sobre dor, luto, amor e companheirismo entre pessoas negras, com foco nos cinco amigos que iniciam o filme tomando uma cerveja na casa de Violeta (Aline Brune). A dupla de diretores conta sobre a vida de cada um, mostrando as dificuldades que eles passaram e como eles tiveram forças para seguir adiante.

Por mais que cada um tenha o seu retrato, é a dona da casa e Margarida (Valdinéia Soriano) que possuem o tempo de tela mais significativo e sustentam tematicamente o filme. Pois, depois que a personagem de Valdinéia Soriano perde o seu filho e se separa do marido, ela começa a viver isolada, distante dos amigos e de pessoas queridas. Não se permitindo mais olhar para trás e encarar a realidade e tampouco seguir em frente em busca de viver a vida. Violeta se vê na obrigação de ajudar a amiga e tentar retribuir os conselhos e todo o auxílio que ela recebeu no passado.

Café com Canela se apresenta como uma verdadeira carta de amor às amizades e à vida. Um brinde!

Disponível no catálogo do Amazon Prime Video

A Lenda de Candyman

O nome de Nia DaCosta passará a ser mais comentado nos próximos meses quando As Marvels, a sequência de Capitã Marvel no MCU, estiver próximo de sua estreia e começar a ser mais divulgado. Mas antes, precisamos falar e exaltar um dos melhores filmes de terror de 2021: A Lenda de Candyman.

O longa é uma sequência espiritual de O Mistério de Candyman, dos anos 90, que adapta o conto The Forbidden de Clive Barker (Hellraiser) ao mesmo tempo que reimagina o slasher e discute temas raciais.

São raras as sequências que conseguem repetir a qualidade da obra original, mas o que DaCosta faz é justamente o oposto da lógica. A diretora incute ainda mais substância no seu filme, ao mesmo tempo que explora melhor os subtextos da história, deixa o personagem mais aterrorizante e trabalha diversas referências de terror em função da temática. A produção e o roteiro coescrito por Jordan Peele (Corra! e Não! Não Olhe!) são a cereja do bolo e a chancela de qualidade.

Disponível no catálogo do Globoplay

Nanny

Mais um terror para a lista e não é por acaso; Peele pavimentou e inspirou uma geração de novos realizadores negros que agora apostam no gênero para discutir a respeito de temáticas raciais e desconstruir alguns contextos. Com Nanny, a estreante Nikyatu Jusu explora a experiência de uma imigrante senegalesa em Nova York, onde trabalha de babá até conseguir dinheiro suficiente para trazer o seu filho de 6 anos da África para os Estados Unidos. Aisha – interpretada pela incrível Anna Diop – constantemente tem sonhos estranhos em que reflete sobre a culpa de ter deixado o seu filho e estar cuidando de outra criança e o peso da saudade, ao mesmo tempo que tem de lidar com a xenofobia e negligência da família americana.

Claramente inspirado por A Negra de…, dirigido por Ousmane Sembène e considerado um marco do cinema senegalês e africano, Jusu articula muito bem as referências através do terror no melhor estilo low-burn, onde as aparições que assombram Aisha vão ganhando sentido na medida que a trama avança.

Disponível no catálogo do Amazon Prime Video

Till

Devastador, doloroso e angustiante são apenas alguns adjetivos capazes de descrever minimamente a história real no qual Till é baseada. É uma história de luta revoltante, que te coloca para sentir as dores de Mammie Till (Danielle Deadwyler), que teve o seu filho, Emmett Till, morto por homens brancos no Mississipi enquanto passava as suas férias com os primos.

A atuação magnética e avassaladora de Danielle Deadwyler nos leva por essa jornada emocional trágica através de um julgamento racista. Por sinal, a atriz foi uma das maiores esnobadas do Oscar 2023, pois tinha de tudo para chegar a premiação como uma das favoritas da noite ao lado de Cate Blanchett e Michelle Yeoh. A única coisa que faltou para ela foram os amigos brancos e influentes que Andrea Riseborough tinha aos montes.

A diretora Chinonye Chukwu não tem papas na língua e não mede esforços para chocar a audiência. Me questionei se existia a necessidade de algumas passagens um pouco mais explícitas e se a realizadora não estaria cometendo alguns excessos imagéticos. Mas, dado o contexto histórico e do próprio caso, vi que ela foi muito corajosa nesse sentido e que, sim, Till, ao contrário de alguns true crimes, pedia isso até pela forma que o caso se desenrolou na época. Mas, ao meu ver, o maior mérito da diretora é em como ela aproveita Deadwyler, sem nunca perdê-la de vista e não esquecendo da temática central do filme: a dor de uma mãe – extraindo o máximo da extensão dramática da atriz e favorecendo a sua presença em todas as cenas.

Disponível no catálogo do Amazon Prime Video

Rye Lane

Muito provavelmente você já escutou falar da Trilogia do Antes ou ao menos Antes do Amanhecer, o primeiro filme. O romance de Richard Linklater é perfeito no que tange o estudo de uma relação e na forma em que constrói ela com muita naturalidade, tendo em vista que acompanhamos a relação dos dois protagonistas do momento que eles se conhecem até a despedida.

A comédia romântica Rye Lane, da estreante  Raine Allen Miller, funciona quase como uma versão moderna do romance de Linklater, pois utiliza praticamente a mesma premissa de dois jovens que acabaram de se conhecer e andam pelas ruas conversando sobre a vida e temas caros a eles. A modernização de Antes do Amanhecer vem através do design de produção que brinca com estilizações em neon e figurinos igualmente coloridos, que, junto a fantástica direção de fotografia, criam imagens lindas, as quais transbordam amor e a inquietude de uma paixão. 

Com protagonistas bem construídos – destaque para Vivian Oparah – e um roteiro que explora tudo o que poderia ser explorado, Rye Lane se torna uma indicação obrigatória no que é, até então, a melhor comédia romântica do ano.

Disponível no catálogo do Star+

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